Como a fusão Marfrig-BRF, gigantes do agronegócio, impacta o mercado

Nova companhia disputará com outros gigantes de alimentos e ampliará acesso do produtor brasileiro ao mercado global. Mas há riscos no radar

May 25, 2025 - 04:00
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Como a fusão Marfrig-BRF, gigantes do agronegócio, impacta o mercado

Duas das principais empresas do setor de alimentos, Marfrig e BRF, movimentaram o mercado ao anunciar a fusão de seus negócios, no último dia 15, o que deu origem a um gigante com uma receita líquida consolidada de R$ 152 bilhões nos últimos 12 meses.

Com o nome MBRF Global Foods Company, a nova companhia será detentora de todas as marcas das duas empresas. A Marfrig, segunda maior produtora de carne bovina do mundo e líder na produção de hambúrgueres, propôs a incorporação da totalidade das ações de emissão da BRF, especializada em aves e dona da Sadia e da Perdigão.

Entenda a fusão Marfrig-BRF

  • A fusão ocorrerá por meio de troca de ações da BRF por papéis da Marfrig, que hoje é a maior sócia da companhia, detendo o controle com 50,49% de participação. Acionistas da BRF vão receber papéis da Marfrig e se tornarão sócios da MBRF Global Foods Company.
  • A relação de troca prevista na operação é de 0,8521 ação da Marfrig para cada papel da BRF. Ou seja: um investidor que possui 100 ações da BRF terá cerca de 85 papéis da Marfrig depois da conclusão do negócio.
  • Os acionistas da BRF e da Marfrig devem ser beneficiados com um pagamento significativo de proventos. A BRF vai distribuir até R$ 3,52 bilhões, e a Marfrig, R$ 2,5 bilhões.
  • Em relação às receitas e custos, a estimativa é alcançar R$ 485 milhões por ano, com expectativa de redução de despesas de R$ 320 milhões anuais.
  • Caso a fusão seja aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a nova empresa deve tentar fazer a listagem de suas ações nos Estados Unidos, segundo executivos de Marfrig e BRF. A Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil), que conta com cerca de 6% do capital da BRF, e o Salic, o fundo soberano da Arábia Saudita, com 11%, apoiam a transação.
  • A união entre Marfrig e BRF talvez seja a mais expressiva de uma série recente de fusões do agronegócio, setor que tem impulsionado a economia brasileira nos últimos anos.
  • Em 2024, houve um aumento de 140% na quantidade de fusões e aquisições no agro, de acordo com dados da KPMG. No ano passado, foram concluídas 12 operações, ante 5 em 2023 e 11 em 2022.

Impacto global

A fusão entre Marfrig e BRF criará um novo “player” global competitivo na disputa com outros gigantes do setor e ampliará o acesso de produtores brasileiros aos mercados internacionais, de acordo com especialistas ouvidos pelo Metrópoles.

“Essa fusão criou um colosso, um player global agora capaz de brigar com Tyson Foods, JBS e outras gigantes do setor. Isso é bem relevante para a cadeia como um todo, principalmente na dinâmica de fornecedores. Agora você tem um player muito poderoso para a escala, o que acaba gerando benefícios adicionais, em detrimento de fornecedores como tradings ou produtores rurais de grande porte”, avalia Hugo Queiroz, sócio e diretor da L4 Capital.

“O agronegócio, por si só, tem margens de lucro muito baixas, comparado a outros setores da economia, principalmente por causa da volatilidade dos preços das commodities”, explica. “Geralmente, você precisa de escala para preservar algum incremento adicional, justamente para ter maior poder de barganha junto aos clientes. Para ter alavancagem efetiva, muitas vezes se usa o capital de terceiros. Isso força os grupos a se unirem, até por uma questão de sobrevivência.”

Octaciano Neto, fundador da Zera e ex-secretário estadual de Agricultura do Espírito Santo, observa que a fusão “dá oportunidade para que produtores rurais brasileiros de frango, suíno e boi ampliem o acesso a mercados internacionais, mesmo que indiretamente”. “Eles vendem para a Marfrig e para a BRF, e elas vendem para o mercado externo. Vai fortalecer o produtor brasileiro como um grande fornecedor de proteína animal no mundo”, aposta.

Segundo Queiroz, a união entre os negócios de Marfrig e BRF oferece “uma grande possibilidade de que o faturamento de R$ 152 bilhões cresça rapidamente”. “Globalizar as marcas Sadia e Perdigão vai ser muito mais confortável porque elas já são conhecidas internacionalmente. Eventualmente, podemos ter a entrada de Sadia e Perdigão no mercado norte-americano. Em suma, pode haver o crescimento das exportações”, afirma.

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Acionistas insatisfeitos e outros riscos

Apesar do otimismo do mercado em relação à parceria entre os dois gigantes de alimentos, um relatório do BTG Pactual apontou limitações nas sinergias operacionais envolvendo as empresas. Segundo o documento, a fusão deve trazer ganhos importantes em escala e presença global, mas a Marfrig pode ficar exposta a riscos como variações na taxa de juros, câmbios e níveis de emprego, além da volatilidade nos preços de commodities e eventuais restrições sanitárias e comerciais em alguns mercados.

Em relação à BRF, o banco aponta relativa dependência da empresa de negociações com governos, além do risco de sanções por países que importam seus produtos. Surtos de doenças animais e a imposição de tarifas comerciais também constituem ameaças adicionais, diz o BTG.

Como se não bastassem os riscos inerentes ao processo de fusão, alguns acionistas minoritários da BRF teriam demonstrado insatisfação com os termos do acordo e a relação de troca com a Marfrig, considerada desfavorável por eles. De acordo com o Morgan Stanley, a operação representa um valor por ação de R$ 17,30 para os acionistas da BRF – um desconto de cerca de 16% em relação ao preço negociado antes do anúncio da fusão. Desse montante, R$ 15,10 seriam oriundos da relação de troca com a Marfrig e outros R$ 2,20 viriam dos dividendos que serão distribuídos pela BRF.

Em linhas gerais, apesar de os papéis das duas empresas estarem com preços bem próximos, o investidor da BRF ficará com uma quantidade menor de papéis da Marfrig – ou seja, seu investimento deve diminuir no curto prazo, proporcionalmente. A diferença entre o que ele tinha e o que receberá após a fusão não deve ser totalmente compensada pela cotação dos papéis, pelo menos não em um momento inicial.

“Os acionistas entenderam que foi feita uma fusão beneficiando um ativo com características abaixo do que seriam os fundamentos da BRF, o que acabou prejudicando um pouco o preço da ação”, explica Hugo Queiroz. “Para reduzir um pouco esses impactos, foram pagando dividendos para incentivar a aprovação. Mas o mercado ainda viu assimetrias relevantes pelas condições de troca estabelecidas. A impressão inicial é a de que quem vai se beneficiar é a Marfrig.”

Essa percepção explica a trajetória distinta das ações das duas companhias após a fusão ter sido anunciada. Nas primeiras horas do pregão do dia seguinte ao anúncio, em 16 de maio, os papéis da BRF tiveram uma queda forte, enquanto os da Marfrig subiam. No dia 17, a valorização das ações da Marfrig foi de 21%, o que significou um acréscimo de R$ 3,78 bilhões em valor de mercado. No mesmo dia, os papéis da BRF se recuperaram e também fecharam em alta, mas bem menor: 0,78%, adicionando R$ 270 milhões em valor de mercado.

A ameaça da gripe aviária

Uma outra preocupação envolve o registro do primeiro caso de gripe aviária H5N1 detectado no sistema de avicultura comercial do Brasil – que veio a público um dia depois do anúncio da fusão Marfrig-BRF. O caso foi detectado em uma granja na cidade de Montenegro, região metropolitana de Porto Alegre. Apesar de ter derrubado as ações de empresas do agro, o episódio não deve causar maiores problemas para o setor, tampouco afetará o processo de união entre as duas empresas, segundo os especialistas consultados pela reportagem.

“Não tem risco nenhum. O sistema de defesa brasileiro já estava com um plano de contingência pronto, tanto que a resposta do governo federal foi rápida. Se tinham um plano pronto, já se sabia que era um risco iminente. Não tem impacto no agronegócio como um todo. Se tiver impacto, é em um setor, o de avicultura”, afirma Octaciano Neto. “É cedo para fazer essa avaliação porque daqui a 28 dias tudo pode estar liberado novamente. Temos de aguardar até o fim de junho para saber a real dimensão dos embargos à carne de frango brasileira.”

Na última quinta-feira (22/5), o governo informou o início da contagem de 28 dias para que o Brasil possa se declarar livre da gripe aviária. Caso não haja novos casos nesse período, o país retomará seu status sanitário internacional. Até agora, mais de 60 países restringiram a compra de carnes de frango e subprodutos de aves do Brasil.

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