Como as facções usam MCs e bailes como armas de domínio e expansão

À coluna, especialista alertou que alusões é ferramenta para expansão e aumento de poder de facções criminosas

May 25, 2025 - 02:30
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Como as facções usam MCs e bailes como armas de domínio e expansão

“CV, CV… é mais um dia de luta, nós vamo traficar.” Sem duplo sentido e sem medo de retaliações, Marlon Brandon Coelho, o MC Poze do Rodo, tem arrastado multidões enquanto canta sobre armas de guerra, roupas de grife e faz apologia ao uso de maconha.

Na última semana, vídeos em que criminosos exibem fuzis enquanto assistem a um de seus shows na Cidade de Deus, bairro da zona oeste do Rio de Janeiro, viralizaram nas redes sociais.

No entanto, o caso não é isolado. Com milhões de seguidores nas redes, Mauro Davi Nepomuceno, conhecido como Oruam, coleciona músicas que fazem referência à atuação do Comando Vermelho (CV) — facção da qual seu pai, Marcinho da VP, é apontado como um dos líderes.

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Na música Tropa do Urso, Oruam faz alusão ao grupo liderado por Edgar Alves de Andrade, traficante conhecido como Doca ou “Urso”. Somadas todas as visualizações, Oruam acumula mais de 100 milhões de acessos nos clipes postados no YouTube — evidência de seu alcance expressivo e influência.

O cenário não se restringe a uma região isolada. Nas escolas, campos de futebol e ruas das comunidades, os trechos escritos pelos cantores estão na ponta da língua de crianças e adolescentes.

No Brasil, funkeiros, rappers e trappers têm subido aos palcos e cantado letras sobre poder, ostentação e porte de armas — sem titubear, como quem acredita estar imune a punições. Venerados em todo o país, sobretudo nos bailes das comunidades, esses músicos têm protagonizado pautas políticas e levantado debates sobre a apologia à atuação de facções criminosas.

Ameaça à segurança pública À coluna, o especialista em segurança pública Leonardo Sant’Anna afirmou que o uso do entretenimento como ferramenta de alcance não é uma prática nova por parte das organizações criminosas. Segundo ele, esse artifício visa conquistar a confiança da comunidade e recrutar novos integrantes.

“Há bastante tempo, o crime organizado se vale do entretenimento como mecanismo de expansão e fortalecimento econômico — isso é visto em filmes, como Tropa de Elite. O crime explora brechas legais e fragilidades sociais deixadas pelo Estado. Não estamos tratando de nada novo quando vemos cantores alcançando milhares de jovens e adolescentes e contribuindo para a publicidade das facções”, afirmou.

De acordo com o especialista, os riscos dessa prática são diversos: “O crime mapeia e identifica onde há maiores riscos e possibilidades de ganhos. Esses shows envolvem um volume significativo de transações financeiras e uma grande penetração social, o que os torna pontos estratégicos para o crime organizado, que comercializa drogas, contrabandeia armas e dissemina produtos ilícitos. Dessa forma, esse sistema financeiro informal se torna cada vez mais robusto, que é exatamente o objetivo deles.”

Sant’Anna também destacou o caráter propagandístico das músicas e seu potencial de recrutamento. “Essa apologia está presente em músicas, filmes e séries, que romantizam o crime e criam uma narrativa bem estruturada de que o crime é uma necessidade social aos menos favorecidos. A organização desses grandes eventos por parte das facções também faz com que as comunidades passem a confiar nessa atuação ilegal”, alertou. 6 imagensPoze do Rodo e OruamOruam é filho de Marcinho VP, preso e condenado por tráfico de drogas e homícidoPoze do Rodo posa com seus cordões de ouro para as redes sociaisMc Poze do Rodo MC Dym foi rpeso no Aeroporto Internacional de Fortaleza (CE), por envolvimento com facção criminosa Fechar modal.1 de 6

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Oruam é filho de Marcinho VP, preso e condenado por tráfico de drogas e homícidoRedes sociais4 de 6

Poze do Rodo posa com seus cordões de ouro para as redes sociaisInstagram/Reprodução5 de 6

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MC Dym foi rpeso no Aeroporto Internacional de Fortaleza (CE), por envolvimento com facção criminosa Reprodução/Instagram

MCs atrás das grades

Uma operação deflagrada nesta sexta-feira (23/5) colocou dois cantores de funk atrás das grades. Francisco Wanderson Mendes, conhecido como MC Dym, e Carlos Eduardo de Almeida Pires, o MC Dick, foram presos sob suspeita de integrarem o Comando Vermelho.

Nas redes sociais, MC Dym acumula mais de 47 mil seguidores. Seu lançamento musical mais recente ocorreu há um mês: o clipe da música Discípulos de Pablo Escobar — uma alusão ao traficante e narcoterrorista colombiano, fundador do Cartel de Medellín — já registra 16 mil visualizações.

MC Dick, por sua vez, possui cerca de 2 mil ouvintes mensais em plataformas de música e é conhecido por letras que exaltam ações atribuídas ao Comando Vermelho, além de fazer ameaças a policiais e rivais.

Lei Anti-Oruam

Desde o início deste ano, o rapper Oruam foi colocado no centro de debates políticos. O movimento ganhou força a partir de um projeto de lei protocolado pela vereadora Amanda Vettorazzo (União Brasil) na Câmara Municipal de São Paulo. A proposta sugere a vedação da contratação de shows, artistas e eventos abertos ao público infantojuvenil que envolvam expressões de apologia ao crime organizado ou ao uso de drogas.

Após a iniciativa de Vettorazzo, diversos municípios e capitais passaram a adotar o projeto. Enquanto algumas propostas ainda tramitam, outras já foram aprovadas.

Segundo Leonardo Sant’Anna, especialista em segurança pública, a lei — que, na avaliação dele, possui um nome equivocado — representa um primeiro passo para coibir a apologia ao crime.

“O objetivo é criar uma política pública que, caso bem aplicada, consiga contribuir para que a economia do crime deixe de existir. O Oruam é apenas uma peça nesse processo todo; é preciso haver uma lei séria, em favor do cidadão. Começou com um nome equivocado, mas, se tudo seguir o caminho certo, esse é, sim, um começo para sanar as apologias”, avaliou.

A coluna tentou contato com as assessorias dos cantores. Contudo, não obteve respostas até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto.

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