HÁ VINTE ANOS – Bento XVI, um conservador de marca maior (Juan Arias)

Por quem o conheceu ainda jovem

abril 21, 2025 - 08:30
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HÁ VINTE ANOS – Bento XVI, um conservador de marca maior (Juan Arias)

Quem pode ter a tentação de analisar o conclave recém-terminado com os olhos da política terrena tem de reconhecer que se enganou. Não saiu um Papa de centro, como quase todos os analistas esperavam. Um Papa de equilíbrio entre a linha dura e inflexível do cardeal Joseph Ratzinger e os que advogavam, sobretudo no Terceiro Mundo, um Papa que, pelo menos no social e no diálogo com as diferentes culturas e religiões, seguisse a linha de João Paulo II.

Não foi assim. Elegeram um cardeal, no caso o alemão Ratzinger, que antes de se iniciar o conclave, pronunciou um discurso tão intransigente que foi interpretado como seu desejo de não ser eleito Papa, já que não estendeu a mão a ninguém. Foi enfático contra o que condena, como os relativismos teológicos e morais.

Defensor a todo custo dos princípios de uma tradição que não deve mudar para ser fiel a si mesma, o novo Papa repetiu mil e uma vezes que a Igreja, por meio da santidade, deve recuperar o tempo perdido em perigosos ensaios em matéria de fé e de moral. Conheci o hoje Bento XVI quando chegou a Roma como um jovem e progressista teólogo do episcopado alemão para o Concílio Vaticano II. Estava com o teólogo suíço Hans Küng.

Os dois tiveram um papel importante nos avanços daquele concílio convocado pelo ancião João XXIII. Depois, aquele teólogo, progressista na juventude, mudou radicalmente. Tanto que chegou a combater o concílio que antes havia defendido.

Fizeram-no bispo e cardeal e puseram-no à frente da Congregação para a Defesa da Doutrina da Fé. E ele pôs todo seu empenho na defesa da doutrina tradicional, chegando a condenar mais de 100 teólogos por haverem tentado pôr em prática os avanços do Concílio Vaticano II. Condenou a Teologia da Libertação e deixou no ostracismo toda uma bagagem de criatividade teológica dentro da Igreja.

A pergunta que os analistas religiosos se faziam ontem no Brasil é como foi possível que os cardeais do Terceiro Mundo, empenhados na luta contra a miséria, tenham dado seu voto ao cardeal mais rígido do conclave em matéria de fé e de moral. Queriam, a princípio, um Papa parecido com João Paulo II, mas a personalidade do cardeal Ratzinger não pode ser mais diferente. Parece mais um príncipe que um comunicador. Não tem boas relações com a mídia e não tem sido um pastor, mas um burocrata da Cúria Romana.

Aos bispos brasileiros que visitavam João Paulo II queixando-se das condenações vaticanas à Teologia da Libertação, o Papa de então costumava dizer: “O cardeal Ratzinger é muito severo”. Por sua vez, o hoje Bento XVI disse-me um dia delicadamente que o problema é que João Paulo II era um bom filósofo e humanista, mas pouco teólogo e que, por isso, costumava passar-lhe os documentos antes de publicá-los, não tanto como prefeito da Congregação para a Fé, mas também como teólogo.

Ratzinger sempre foi considerado um dos teólogos mais sólidos e preparados da Igreja. João Paulo II o escutava muito e nunca o trocou de posto de defensor da ortodoxia católica, enquanto se permitia, às vezes, sair do roteiro, como quando disse durante uma de suas viagens que não era uma boa ideia que depois da queda do comunismo restasse só um bloco de poder no mundo. E que se tinha de recuperar as coisas positivas do comunismo.

Ratzinger nunca fez concessões semelhantes. Fará agora como Papa?

 

(Transcrito do El País e publicado aqui em 21 de abril de 2005)

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