O ALIENÍGENA (PARTE XXVII)

Clauder Arcanjo* Pirâmide de crânios, de Paul Cézanne     De forma inesperada, quase milagrosa, eis que aparece um animal por entre os pingos da chuva. Aproxima-se do mastro onde se encontra amarrado o pobre cão e ficam bem próximos. Surgem, dentro da caverna, as mais diversas opiniões: — É um baita de um leopardo! […]

Jul 20, 2025 - 00:20
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O ALIENÍGENA (PARTE XXVII)

Clauder Arcanjo*

Pirâmide de crânios, de Paul Cézanne

 

 

De forma inesperada, quase milagrosa, eis que aparece um animal por entre os pingos da chuva. Aproxima-se do mastro onde se encontra amarrado o pobre cão e ficam bem próximos.

Surgem, dentro da caverna, as mais diversas opiniões:

— É um baita de um leopardo!

— Não, é um tigre! Tigre-de-bengala.

— Coisa nenhuma, deve ser uma onça-pintada. Meu Deus!

O Paulo Bodô, envolto ainda nas brumas da cachaça, revela a todos um naco de lucidez:

— Gente, o bicho é menor do que o Goiaba! Vocês não estão exagerando?

João Américo, de volta ao pensamento lógico, revisita, ainda tremendo de medo, alguns princípios de Descartes e vocifera:

Cogito, ergo sum!

O animal que se aproximara do Goiaba não gostou do latim do licaniense e responde, com as garras e os dentes afiados:

— Miau… Shifzzhh… Miau… Shifff… Puffshifzzz…. Miau!

— Alguém aqui entende das línguas dos felinos? — clama, quase em pânico, o protofilósofo de Licânia.

O animal conseguira romper a corda que prendia o Goiaba ao mastro; e os dois, lado a lado, seguiam agora para o interior da caverna.

— Au… Au… Au…

— Miau… Shifzzhh… Miau…

Os sete se abraçaram, amontoando-se no fundo da loca.

— Ô bichinho, quero te avisar que sou um alcóolatra; minha carne deve ser amarga de tanta pinga que eu já bebi. Sugiro você se fartar com a carne de um outro! — argumentou o Zé Aguiar.

— A minha também. Tenho mais tempo de pinga entre todos aqui presentes — completou Baltazar do Bozó, enquanto apontava para Lucas San, mostrando carne boa para o “terrível predador”.

— Miau… Shifzzhh… Miau… Shifzzhh…

 

& & &

 

Caro leitor, o medo faz desgraça. Estraga qualquer relato, amplificando o pavor, tornando o pequeno grandioso; um simples miado, o anúncio da mais temível fera.

Por que digo isso? Ora, porque o animal que se aproximou para retirar o cachorro Goiaba do sofrimento de continuar amarrado embaixo de um temporal não foi nada mais nada menos do que o nosso conhecido Nabuco. Sim, o gato Nabuco.

E o pior, estou impossibilitado de dar prosseguimento a esta minha narrativa. Por quê?! Todos os meus sete valentes personagens desmaiaram com o miado último do Nabuco.

Neste momento temos um gato, um cachorro e sete (que vergonha!) valorosos cidadãos desmaiados.

Esta minha vida de narrador não me tem sido fácil!

 

& & &

 

No fundo da caverna, enquanto os nove dormem, surge, junto à entrada, um…

— Não, não!…

Em desespero, fecho a minha prosa por hoje.

Rezem por este novelista.

 

*Clauder Arcanjo é escritor e editor, membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

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