Pastor acusado de assédio falava em “ungir partes íntimas” de vítimas
Pastor da Igreja Evangélica Crescendo em Cristo, em São Paulo, é acusado de assediar ao menos 25 mulheres. Ele não quis se manifestar

São Paulo – Um pastor de uma igreja evangélica na zona leste de São Paulo é acusado de assediar sexualmente fiéis. Vítimas relataram ao Metrópoles que Humberto Miguez, da Igreja Evangélica Crescendo em Cristo (IECC), no distrito de Itaquera, oferecia “ungir partes íntimas” das mulheres.
A reportagem conversou com quatro mulheres que afirmam terem sido assediadas sexualmente por Humberto, entre 2010 e 2024. Todas frequentavam a IECC. Segundo os relatos, o número de vítimas varia entre 25 e 40 fiéis. Ao menos cinco delas registraram boletim de ocorrência.
Envergonhadas e com medo de retaliação, as mulheres pediram para ter suas identidades preservadas. As denúncias estão sendo expostas após a reportagem apurar mensagens trocadas entre o religioso e as vítimas — em algumas, ele confessa ter praticado o assédio sexual. Os registros policiais também foram acessados na íntegra.
Pastor oferecia ungir partes íntimas
Parte das mulheres que conversaram com a reportagem estavam em processo de divórcio quando foram assediadas pelo pastor – uma delas por conta de um adultério cometido pelo marido. O líder religioso usava do fato para se aproximar das vítimas, chegando a oferecer ungir suas partes íntimas para curar uma suposta “maldição”.
“Ele orou, ungiu minha casa e disse que precisava ungir minhas partes íntimas para que a maldição do adultério fosse quebrada, para que toda contaminação que meu esposo tinha trazido fosse quebrada, que só assim eu poderia recomeçar”, relatou uma das mulheres à polícia.
Em pelo menos um caso o pastor chegou a consumar o contato físico. Quando uma das mulheres negou a unção, o pastor questionou se era porque ela sentiria medo de sentir prazer, por estar com “falta de relação [sexual]”.
Em outro caso, uma vítima havia passado por uma separação temporária, período em que esteve afastada da igreja. Quando voltou a frequentar os cultos, acompanhada do marido, a fiel foi abordada de forma invasiva por Humberto, que teria dito que ela “deu muito e deu gostoso” no tempo em que esteve solteira.
O pastor também é acusado de tocar fisicamente a vítima, puxando pelos braços, cintura e dando beijos no rosto em momentos inapropriados.
Assédio a idosas e adolescentes
Segundo os relatos, mesmo que Humberto tenha se aproximado principalmente de mulheres adultas em processo de separação, as vítimas tinham perfis bastante diferentes. Ele teria assediado uma idosa, mãe de uma das fieis que também recebeu investidas do pastor. A mulher, envergonhada e com receio de ter dado “abertura” ao pastor, enfrentou dificuldades para conseguir relatar o caso à filha.
Outra vítima, cujas sobrinhas também frequentavam a igreja, afirmou à reportagem que o religioso já assediou as adolescentes. As meninas, que dançavam nos cultos, se trocavam em uma sala vigiada por câmera de segurança. Segundo o pastor, o equipamento não funcionava, mas as mulheres suspeitam que isso seja mentira.
Em uma ocasião, uma adolescente de 15 anos estava se trocando e foi vista sem sutiã pelo pastor. Ela pediu perdão e ele imediatamente disse que poderia ver o corpo da menina pois era o pastor dela, relatou uma vítima.
Dinâmica do assédio
- Os boletins de ocorrência, obtidos pelo Metrópoles, relatam a dinâmica do assédio sexual praticado pelo pastor Humberto Miguez.
- Segundo os relatos, o religioso procurava as mulheres por mensagem, geralmente no Facebook, sempre na parte da noite.
- Era comum que ele elogiasse as fieis, como as roupas que vestiam, e iniciasse conversas de conotação sexual.
- A uma delas, o pastor perguntou se ela estaria usando calcinha fio-dental durante o culto, e pediu para que usasse peças íntimas maiores.
- Em uma mensagem, Humberto disse que “não conseguia tirar da cabeça a cena da vítima subindo a escada com aquela calcinha”, conforme o registro policial.
- Para as mulheres que estavam se separando, o pastor costumava perguntar se elas sentiam falta de sexo.
- A uma das fieis, ele questionou se o ex-marido a satisfazia sexualmente.
- Para a mulher que passou um período solteira, o pastor disse que queria saber com quantos homens ela se relacionou, pois era seu líder religioso e “gostaria de saber”.
- A outra vítima, o religioso exigia que ela enviasse prints comprovando que apagou as mensagens trocadas, para que o marido da mulher não visse o conteúdo.
Vítimas se uniram
Algumas das vítimas do pastor frequentaram a igreja por mais de 10 anos. Os assédios, no entanto, não teriam acontecido durante todo esse tempo. Uma das mulheres disse à reportagem que chegou a ouvir, antigamente, alguns relatos, mas só acreditou quando ela mesma foi alvo, há pouco menos de dois anos.
O caso estourou quando a mulher de um pastor, que ministrava cultos na IECC, também foi assediada. Após o episódio circular entre a comunidade religiosa, muitas das vítimas se uniram, e pararam de frequentar a igreja. Algumas delas se uniram para registrar um boletim de ocorrência.
O sentimento entre as fieis é bastante parecido, mesmo entre as que foram assediadas há 15 anos, ou no ano passado. Todas elas disseram ao Metrópoles que sentiram vergonha durante os assédios, e se questionaram se deram abertura para as investidas do pastor.
“Nunca duvidamos que ele fosse um homem de Deus”, disse uma das vítimas.
Quando as mulheres viram que havia pelo menos 25 alvos de assédio, perceberam que elas tinham sido vítimas de um crime.
Filha do pastor procurou vítimas
Outra semelhança entre as mulheres que falaram com a reportagem é que todas elas foram procuradas pela filha do pastor para esclarecer o caso. “Meu intuito é realmente fazer essa abordagem para poder deixar uma porta aberta, escutar também, ser apoio, porque é muito complicado e é muito delicado”, disse ela em um áudio enviado a uma das fieis.
A filha de Humberto relatou em mensagens que um dos motivos do contato era evitar a impressão de que “nada estava sendo feito”. Como exemplo, ela apontou o afastamento do pai do púlpito, que parou de pregar na igreja após a repercussão das denúncias. No entanto, ele ainda frequenta o local.
“Deus sabe de todas as coisas, né? Eu creio que nada saiu do controle do Senhor”, disse a mulher a uma das vítimas. Ela também pediu perdão em nome do pai e da igreja.
Uma das vítimas foi abordada pela própria esposa do líder religioso. Ela disse, em mensagem de texto (veja acima), que a igreja não estaria “protegendo ninguém”, e que o marido, afastado do púlpito, estaria de “resguardo buscando a restauração”.
Humberto foi procurado pela reportagem para comentar o caso. O pastor afirmou que daria declarações apenas através do seu advogado, o que não ocorreu até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto.
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