Raquel Barreto: O Tempo da Minha Amiga
Minha amiga não sabe ver as horas em relógio de ponteiro. Diante de um mostrador analógico, ela trava. Os olhos pulam dos números, mas o cérebro não acompanha. Se não for digital e de preferência marcando horas inteiras, como 8:00 ou 10:00 ela se perde no tempo, literalmente. Ela diz que o ponteiro pequeno confunde, […]


Minha amiga não sabe ver as horas em relógio de ponteiro.
Diante de um mostrador analógico, ela trava. Os olhos pulam dos números, mas o cérebro não acompanha. Se não for digital e de preferência marcando horas inteiras, como 8:00 ou 10:00 ela se perde no tempo, literalmente.
Ela diz que o ponteiro pequeno confunde, o grande mais ainda. E quando o relógio é só números, sem ponteiros nem lógica digital só um círculo com marcas aí é que o tempo vira um enigma indecifrável.
Engraçado como ela só enxerga o tempo quando ele é exato, objetivo, claro. Nada de suposições. Nada de “faltam quinze para”. O tempo dela é imediato, como quem só consegue viver o agora se ele estiver escrito na testa do dia.
Às vezes penso que talvez ela enxergue o tempo com mais urgência que eu. Eu, que gosto de medir a vida pelas sombras do ponteiro, pelos intervalos, pelos quase. Ela não. Ela precisa que o tempo diga a que veio.
Acho que, no fundo, é só uma maneira diferente de existir. Ela vive de hora cheia. Eu, de instantes. Raquel Barreto
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