Quando Edan Alexander foi libertado pelo Hamas, no último dia 12, Einav Zangauker recebeu uma importante notícia: o filho dela, Matan, estava vivo. Ele foi sequestrado em 7 de outubro e dividia o cativeiro com Edan. Mas, junto com a confirmação de que o filho seguia vivo, outras informações vieram à tona. Matan está debilitado, em sua saúde física e mental. Com pés e mãos acorrentados, passou períodos preso em uma jaula, foi interrogado e torturado.
A comida recebida por Matan é escassa: pão seco e arroz, acompanhado de água turva e suja, o que lhe provoca problemas intestinais. Ele perdeu peso e tem sofrido com tremores e enfraquecimento muscular. Também está sujeito a picadas de inseto e mordidas de rato.
Neste período de quase 600 dias com o filho em cativeiro, Einav tornou-se um dos símbolos da luta pela libertação dos reféns. Ativa, vocal, ela exige que o governo de Benjamin Netanyahu abra mão da guerra, em prol de trazer o filho e os demais reféns de volta. No fim de 2024, ela prometeu ser “o pior pesadelo” do primeiro-ministro, se ele não trabalhasse para libertar os reféns.
“Netanyahu está nos arrastando para uma guerra política que levará à morte de reféns e soldados”, declarou após a intensificação recente da ofensiva em Gaza.
Com a aparência cansada e o rosto muito mais magro em relação à mulher que falava 6 meses atrás na Praça dos Reféns, Einav dirigiu-se diretamente ao filho: “Eu sei que você está sozinho, e nós dois sabemos que o primeiro-ministro está fazendo tudo para que você não volte vivo. Mas eu quero que você saiba: sua mãe está lutando por você! O povo de Israel está lutando por você!”.
Einav é o símbolo de muitas mães israelenses que passaram e ainda passam pela dor de saber que o filho tem fome, é torturado e não tem perspectiva de ser libertado. O que um dia foi esperança, dá lugar ao desespero.
Do outro lado da fronteira, está Assmaa Abo Eldijian, mãe de quatro filhos. Palestina, ela nasceu nos Emirados Árabes e viveu no Brasil por 16 anos. Em 2006, voltou para Gaza para visitar o avô e nunca mais deixou a região – apesar de ter tentado e seguir tentando voltar para o Brasil.
Em entrevista ao podcast “O Assunto”, do g1, Assmaa contou que, no dia da conversa com a jornalista Natuza Nery, ainda não havia comido. “O pouco de comida que tem, eu deixo para os meus filhos. Se tenho fome, eu tento tomar um chá de hortelã”, relatou.
Seus filhos têm entre 5 e 20 anos. “Meu filho está louco para sair (de Gaza). Meu filho de 13 anos, Mahmoud, me pergunta se vamos conseguir ir para o Brasil, se vamos conseguir comer uma pizza”, conta. A família apela ao governo brasileiro para ser retirada de Gaza, mas enfrenta dificuldades por não ser naturalizada. O pai ainda vive no Brasil, mas também não é naturalizado. “Meu filho, quando ouviu que eu estava falando com o advogado, passando meu documento brasileiro, ficou com muita esperança e não conseguiu dormir. Quando eu vi essa esperança nos olhos dele, eu fiquei desesperada. Estou tentando tudo para sair daqui”.
“Para eles (o governo brasileiro), eu seria mais um papel. Mas, para mim, é vida ou morte. É o futuro dos meus filhos. Desde que essa guerra começou, nós já perdemos, meus filhos não vão mais à escola, eles não brincam mais. Eu fico muito nervosa, porque só consigo pensar o dia todo em como eu vou trazer comida para os meus filhos”, relata. “Eu tenho a sensação de morrer 24 horas por dia. Todo dia você acorda com a mesma sensação, de morrer, de não saber como vai trazer comida, de ver seus filhos doentes. Eu não sei mais o que fazer”.
Assmaa afirma que, na outras guerras, os alvos israelenses eram mais precisos, não havia destruição ou mortes em massa. Havia eletricidade e comida, sem alteração significativa de preços. Mas, hoje, ela já não consegue levar o filho doente ao hospital, seja por não ter carro, não se sentir segura ou pelo medo de o hospital ser atingido. Quando a ajuda humanitária entra em Gaza, Assmaa corre para conseguir arroz para alimentar a família.
De lados distintos da fronteira, Assmaa e Einav são duas mulheres cujas vidas mudaram para sempre por causa da guerra. Duas mães que há quase 600 dias não conseguem sequer pensar em um amanhã porque não têm certeza se os filhos estarão vivos ao fim do dia.
Einav, assim como todas as mães israelenses, tem direito de ter o filho de volta: Matan e todos os reféns devem voltar para Israel. Assmaa, assim como todas as mães palestinas, tem o direito de viver em paz com os filhos, tendo comida para alimentá-los diariamente.
A continuidade guerra não mudará os rumos destas tragédias. É preciso seguir pelo caminho do diálogo, da diplomacia, com um comprometimento a longo prazo com um futuro melhor. É isso que se espera de líderes que prezam pela vida dos povos que lideram – é essa ausência que temos sentido dia a dia.