Encontro com Trump foi 'tremenda vitória' de Lula e 'terá impacto significativo na eleição', diz cientista político
Negociação fecha flanco da campanha de Lula em 2026, avalia Hussein Kalout. REUTERS O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conseguiu, em poucos meses, reverter o mal-estar com o governo dos Estados Unidos e se reuniu com o presidente Donald Trump neste domingo (26/10), na Malásia, onde ambos participam da cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean). A conversa foi marcada pelo clima cordial, com Trump se dizendo "honrado" em encontrar o presidente brasileiro. VEJA NO VÍDEO ABAIXO: Casa Branca publica foto de Lula e Trump: 'Grande honra estar com o presidente do Brasil' Para o cientista político Hussein Kalout, ex-secretário de Assuntos Estratégicos no governo Michel Temer (MDB), o encontro foi uma "tremenda vitória" do petista e "terá impacto eleitoral significativo" em 2026, quando Lula tentará um quarto mandato presidencial. Do outro lado, ele vê o campo bolsonarista enfraquecido, com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) condenado por tentativa de golpe de Estado e Trump, seu mais importante aliado, tecendo elogios a Lula. Isso não significa, porém, que a tarifa de 50% imposta contra produtos importados do Brasil será facilmente revertida. Essas negociações devem se alongar, e o desfecho dependerá da disposição de cada lado em fazer concessões, avalia Kalout. A próxima conversa entre os dois países está marcada para segunda-feira (27/10), ainda na Malásia, entre o chanceler Mauro Vieira e o representante comercial dos EUA, Jamieson Greer. "Trump se colocou aberto a negociar. Pode ser que reduza a tarifa para alguns produtos e para outros não", pondera Kalout. Ainda assim, na sua visão, o episódio deixa o presidente bem posicionado junto ao setor produtivo brasileiro, afetado pelo tarifaço. Logo após a reunião dos presidentes, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou uma nota avaliando o encontro como "positivo": "O diálogo entre os dois líderes representa um avanço concreto nas tratativas bilaterais e reforça o compromisso de ambos os governos com a construção de soluções equilibradas para o comércio entre Brasil e Estados Unidos". Na visão de Kalout, a aproximação de Lula e Trump esvazia o discurso que candidatos opositores poderiam usar contra o presidente na campanha eleitoral. "Antes desse encontro, seria um flanco [para a campanha de Lula] qualquer candidato da direita dizer que ele pode estabelecer relações melhores com os Estados Unidos do que Lula, em prol de benefícios para o setor produtivo", diz o cientista político. "Esse flanco deixou de existir, a não ser que as negociações degringolem até lá. E, obviamente, o governo vai ser muito cuidadoso para evitar esse fracasso." Kalout acredita que a gestão Lula fará o possível para manter esses dividendos eleitorais na disputa pela Presidência em 2026. "O governo, no limiar, pode eventualmente fazer concessões que não estaria disposto [em outro momento] para não perder essa vitória política. Ou pode fazer ofertas atraentes para os americanos para manter a negociação em curso e esse bom diálogo." Trump e Lula em primeiro encontro formal, na Malásia. REUTERS Para Kalout, a experiência política de Lula contou para superar a crise com Trump e o petista soube atuar "com paciência, com firmeza e com prudência". Por outro lado, ele nota que a mudança de postura do presidente americano tem relação com interesses econômicos, já que o tarifaço encarece produtos importados do Brasil, gerando inflação nos EUA. Além disso, afirma, a aproximação de Trump tem a ver com o receio de que o Brasil pendesse mais para a órbita chinesa. "A estratégia americana me parece clara. Compreenderam o peso e importância do Brasil economicamente e estrategicamente", diz Kalout, Em postagem no Twitter, Lula disse que a reunião foi "ótima" e acrescentou que as negociações continuam "imediatamente" para buscar soluções para o tarifaço e também para sanções contra autoridades brasileiras impostas por Trump, no contexto do julgamento de Bolsonaro. LEIA TAMBÉM: Hugo Motta, Alckmin e Eduardo Bolsonaro: veja reações ao encontro entre Lula e Trump Trump se impressionou com tempo em que Lula ficou preso e demonstrou 'empatia', segundo assessores O impacto sobre o bolsonarismo As sanções adotadas por Trump contra o Brasil foram justificadas como uma resposta a uma suposta perseguição ao ex-presidente Jair Bolsonaro pela Justiça brasileira. Além do tarifaço, a Casa Branca suspendeu o visto de sete ministros do Supremo Tribunal Federal e aplicou punições financeiras ao ministro Alexandre de Moraes, usando a lei Magnitsky. Ainda assim, a Corte condenou Bolsonaro a 27 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado. As medidas foram adotadas nos últimos meses após forte atuação do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) junto ao governo americano, após se mudar para Washington em fevereiro. Em setembro, a Procuradoria-Geral da República apresentou denúncia ao STF contra o deputado e o blogueiro Paulo Renato Figueiredo por coação devido a sua campanha nos Estados Uni

Negociação fecha flanco da campanha de Lula em 2026, avalia Hussein Kalout. REUTERS O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conseguiu, em poucos meses, reverter o mal-estar com o governo dos Estados Unidos e se reuniu com o presidente Donald Trump neste domingo (26/10), na Malásia, onde ambos participam da cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean). A conversa foi marcada pelo clima cordial, com Trump se dizendo "honrado" em encontrar o presidente brasileiro. VEJA NO VÍDEO ABAIXO: Casa Branca publica foto de Lula e Trump: 'Grande honra estar com o presidente do Brasil' Para o cientista político Hussein Kalout, ex-secretário de Assuntos Estratégicos no governo Michel Temer (MDB), o encontro foi uma "tremenda vitória" do petista e "terá impacto eleitoral significativo" em 2026, quando Lula tentará um quarto mandato presidencial. Do outro lado, ele vê o campo bolsonarista enfraquecido, com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) condenado por tentativa de golpe de Estado e Trump, seu mais importante aliado, tecendo elogios a Lula. Isso não significa, porém, que a tarifa de 50% imposta contra produtos importados do Brasil será facilmente revertida. Essas negociações devem se alongar, e o desfecho dependerá da disposição de cada lado em fazer concessões, avalia Kalout. A próxima conversa entre os dois países está marcada para segunda-feira (27/10), ainda na Malásia, entre o chanceler Mauro Vieira e o representante comercial dos EUA, Jamieson Greer. "Trump se colocou aberto a negociar. Pode ser que reduza a tarifa para alguns produtos e para outros não", pondera Kalout. Ainda assim, na sua visão, o episódio deixa o presidente bem posicionado junto ao setor produtivo brasileiro, afetado pelo tarifaço. Logo após a reunião dos presidentes, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou uma nota avaliando o encontro como "positivo": "O diálogo entre os dois líderes representa um avanço concreto nas tratativas bilaterais e reforça o compromisso de ambos os governos com a construção de soluções equilibradas para o comércio entre Brasil e Estados Unidos". Na visão de Kalout, a aproximação de Lula e Trump esvazia o discurso que candidatos opositores poderiam usar contra o presidente na campanha eleitoral. "Antes desse encontro, seria um flanco [para a campanha de Lula] qualquer candidato da direita dizer que ele pode estabelecer relações melhores com os Estados Unidos do que Lula, em prol de benefícios para o setor produtivo", diz o cientista político. "Esse flanco deixou de existir, a não ser que as negociações degringolem até lá. E, obviamente, o governo vai ser muito cuidadoso para evitar esse fracasso." Kalout acredita que a gestão Lula fará o possível para manter esses dividendos eleitorais na disputa pela Presidência em 2026. "O governo, no limiar, pode eventualmente fazer concessões que não estaria disposto [em outro momento] para não perder essa vitória política. Ou pode fazer ofertas atraentes para os americanos para manter a negociação em curso e esse bom diálogo." Trump e Lula em primeiro encontro formal, na Malásia. REUTERS Para Kalout, a experiência política de Lula contou para superar a crise com Trump e o petista soube atuar "com paciência, com firmeza e com prudência". Por outro lado, ele nota que a mudança de postura do presidente americano tem relação com interesses econômicos, já que o tarifaço encarece produtos importados do Brasil, gerando inflação nos EUA. Além disso, afirma, a aproximação de Trump tem a ver com o receio de que o Brasil pendesse mais para a órbita chinesa. "A estratégia americana me parece clara. Compreenderam o peso e importância do Brasil economicamente e estrategicamente", diz Kalout, Em postagem no Twitter, Lula disse que a reunião foi "ótima" e acrescentou que as negociações continuam "imediatamente" para buscar soluções para o tarifaço e também para sanções contra autoridades brasileiras impostas por Trump, no contexto do julgamento de Bolsonaro. LEIA TAMBÉM: Hugo Motta, Alckmin e Eduardo Bolsonaro: veja reações ao encontro entre Lula e Trump Trump se impressionou com tempo em que Lula ficou preso e demonstrou 'empatia', segundo assessores O impacto sobre o bolsonarismo As sanções adotadas por Trump contra o Brasil foram justificadas como uma resposta a uma suposta perseguição ao ex-presidente Jair Bolsonaro pela Justiça brasileira. Além do tarifaço, a Casa Branca suspendeu o visto de sete ministros do Supremo Tribunal Federal e aplicou punições financeiras ao ministro Alexandre de Moraes, usando a lei Magnitsky. Ainda assim, a Corte condenou Bolsonaro a 27 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado. As medidas foram adotadas nos últimos meses após forte atuação do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) junto ao governo americano, após se mudar para Washington em fevereiro. Em setembro, a Procuradoria-Geral da República apresentou denúncia ao STF contra o deputado e o blogueiro Paulo Renato Figueiredo por coação devido a sua campanha nos Estados Unidos. Se, naquele momento, o filho de ex-presidente deixou claro o prestígio de sua família na gestão Trump, agora a reunião do republicano com Lula "enterra a força do bolsonarismo junto à Casa Branca", nota Kalout. Na sua visão, é improvável que esse cenário se reverta, embora o presidente americano possa muitas vezes atuar de forma volátil. "Trump é mercurial? Sim. Se perceber que Lula está muito enfraquecido daqui a um ano e que Bolsonaro está fortalecido, ele pode mudar de opinião. Mas não é o cenário que se avista", avalia Kalout. O ex-presidente está preso preventivamente em prisão domiciliar desde agosto. Embora ele ainda possa recorrer da condenação, a expectativa é que o STF mantenha a decisão. Além de pedir o fim do tarifaço, Lula também tenta convencer Trump a retirar as sanções contra os ministros do STF. Até o momento, porém, o presidente americano não deu indicações de que fará isso. Para Kalout, a tendência é que as sanções sejam mantidas, porque sua retirada tão rapidamente seria uma admissão de que os EUA erraram ao acusar o STF de perseguir Bolsonaro. Por outro lado, diz o cientista político, essas sanções podem ser usadas por Trump como ferramenta de negociação, na tentativa de obter mais concessões do Brasil. O país tem interesse em maior acesso às reservas brasileiras de terras raras — grupo de elementos químicos usados na fabricação de produtos tecnológicos e equipamentos de alta precisão. Outro tema importante para Trump é a regulamentação das big techs (grandes empresas de tecnologia) no Brasil. Na área comercial, a Casa Branca quer a abertura do mercado brasileiro ao etanol à base de milho produzido nos EUA. Trump tentou interferir em julgamento de Bolsonaro sem sucesso. REUTERS Durante a semana, Trump defendeu tarifa sobre carne brasileira Mesmo com os esforços do encontro para tentar selar a paz, os dois líderes também deram sinais de que não pretendiam recuar de suas posições durante a semana que antecedeu o encontro. Na quarta-feira (22/10), Trump afirmou que os pecuaristas americanos "estão indo bem" graças à tarifa imposta sobre o gado de outros países, como o Brasil. "Os pecuaristas, que eu adoro, não percebem que a única razão pela qual estão indo tão bem — pela primeira vez em décadas — é porque impus tarifas sobre o gado que entra nos Estados Unidos, incluindo uma tarifa de 50% sobre o Brasil", escreveu em sua rede social. O republicano acrescentou que, se não fosse por ele, os criadores de gado americanos "estariam na mesma situação dos últimos 20 anos", que classificou como "péssima". Já Lula, na quinta (23/10), voltou a defender alternativas ao dólar no comércio global. Durante visita à Indonésia, antes de ir para a Malásia, o presidente afirmou que tanto o Pix quanto o sistema de pagamentos indonésio têm potencial para facilitar o intercâmbio entre os dois países e entre os membros do bloco Brics. "O século 21 exige que tenhamos a coragem que não tivemos no século 20", disse Lula, ao defender "uma nova forma de agir comercialmente, para não ficarmos dependentes de ninguém", sem citar diretamente os Estados Unidos. A defesa de moedas alternativas à americana, reforçada pelo Brasil durante a cúpula dos Brics em julho, foi apontada por Trump como um dos motivos para a imposição das tarifas às exportações brasileiras.
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