INSS: entidades usaram cópias de RG para fraudar biometria de aposentados

Entidades da Farra do INSS usavam até xerox de fotos de RG no lugar de selfies que deveriam comprovar adesão de aposentados ao desconto

Oct 3, 2025 - 04:00
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INSS: entidades usaram cópias de RG para fraudar biometria de aposentados

Documentos reunidos pela Controladoria-Geral da União (CGU) revelam que entidades envolvidas na Farra do INSS utilizaram até fotos xerocadas e manipuladas de RG para fraudar a biometria facial exigida pelo Instituto Nacional do Seguro Social na hora de filiar aposentados que sofreriam descontos associativos em seus benefícios sem consentimento.

A reportagem teve acesso a milhares de páginas de documentos apresentados pelas entidades nos processos abertos para firmar os Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com o INSS. O pacote inclui fichas de filiação, fotos de aposentados e contratos feitos por associações e sindicatos com empresas de biometria ligadas a investigados no esquema bilionário de descontos indevidos, revelado pelo Metrópoles.

Nos documentos é possível identificar uma série de filiações feitas de forma fraudulenta, com manipulação e até xerox das fotos de RG dos aposentados (veja exemplos abaixo). Essas imagens foram colocadas no espaço onde deveria haver selfies atuais dos filiados para comprovar a anuência de aposentados em relação aos descontos nos seus benefícios. 3 imagensFotos de biometria apresentadas pelas entidades da farra do INSS tinham até cópia de fotografias do RGFotos de biometria apresentadas pelas entidades da farra do INSS tinham até cópia de fotografias do RGFechar modal.1 de 3

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Fotos de biometria apresentadas pelas entidades da farra do INSS tinham até cópia de fotografias do RGReprodução

A validação das filiações de aposentados por meio de biometria facial passou a ser exigida pelo INSS em 2024, após o Metrópoles revelar a farra dos descontos indevidos. Posteriormente, contudo, a CGU identificou a utilização de plataformas eletrônicas com o objetivo de simular a legalidade nas fichas de filiação, burlando exigências previstas nas normas do INSS, como biometria digital.

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De acordo com a apuração do órgão, associações recorreram a empresas que teriam desenvolvido ferramentas específicas para a criação de fichas fraudulentas. Por essa atuação suspeita, entraram na mira da CGU as empresas Soluções Power BI Software Tecnologia e Internet, Confia Tecnologia da Informação e Dataqualify Desenvolvimento, Assessoria e Dados.

Juntas, essas empresas foram contratadas por entidades investigadas nas fraudes do INSS que arrecadaram R$ 2,2 bilhões em descontos associativos. O esquema só foi efetivamente desarticulado após a Operação Sem Desconto, deflagrada pela Polícia Federal (PF) em abril deste ano. Nos pedidos feitos à Justiça, a PF listou 38 reportagens do Metrópoles.

Fotos antigas de RG

Entre as fichas analisadas pela CGU e obtidas pelo Metrópoles, estão diversas de supostos filiados à Cenap.Asa. Inúmeras fotos apresentadas pela entidade, porém, são as mesmas dos RGs das pessoas ou até de cópias preto e branco do documento. Algumas delas foram coloridas aparentemente de maneira artificial. Chama a atenção também que no espaço reservado para as selfies atuais da biometria facial aparecem fotos de aposentados de quando eles eram visivelmente mais novos.

A reportagem também apurou junto a pessoas que processam entidades que mesmo quando elas apresentam fotos legítimas na biometria há suspeitas de fraudes – isso porque as pessoas não reconhecem o envio dessas imagens a essas entidades. Na Justiça, apenas a foto não tem sido reconhecida pelos juízes como prova de que as pessoas realmente concordaram em se filiar a esses sindicatos.

A Cenap.Asa foi descredenciada pelo INSS no ano passado e hoje é alvo de processos judiciais e de processo de responsabilização pela CGU. A entidade também é alvo de reclamações por descontos indevidos no site Reclame Aqui. Um dos reclamantes afirmou estar processando a entidade por descontos indevidos e citou nominalmente a empresa Soluções Power BI Software Tecnologia e Internet. “Como havia dito, estou com documento gerado por esta empresa que é falsificado e este administrador não responde nenhuma ligação para esclarecer”.

Fábrica de biometria fake

A reportagem localizou oito entidades que contrataram a Power Bi, uma empresa que pertencente ao empresário Igor Dias Delecrode, investigado na Farra do INSS. Apenas essas entidades arrecadaram R$ 1,4 bilhão com descontos em aposentadorias.

Delecrode não apenas é dono de empresas prestadoras de serviços das associações como têm vínculos estatutários com três delas. A Amar Brasil, Master Prev e Aasap tiveram o empresário como dirigente. Todas são investigadas pelas fraudes.

Como já mostrou o Metrópoles, por trás dessas três associações, estão empresários ligados ao mercado de créditos consignados e clubes de benefícios, como Américo Monte, Anderson Cordeiro e Felipe Gomes Macedo. Juntos, eles receberam mais de R$ 70 milhões das associações.

Gomes Macedo, como apontou a PF, doou R$ 60 mil para a campanha do ex-ministro da Previdência Onyx Lorenzoni. No Judiciário, assinaturas dessas associações têm sido desconsideradas por juízes quando elas tentam provar que filiaram, de fato, aposentados.

Em um dos processos, a Aasap juntou um contrato com assinatura digital para provar que o aposentado que lhe processou por descontos indevidos era, de fato, seu filiado. A defesa dele disse que a geolocalização da assinatura mostrava que seu cliente estava na capital paulista, a 580 quilômetros da cidade onde ele mora, na fronteira com Mato Grosso do Sul. A entidade foi condenada.

Presidente e validador

Uma das associações contratou a empresa do próprio presidente para validar suas assinaturas digitais. Trata-se da Associação de Assistência Social a Pensionistas e Aposentados (AASPA), que faturou R$ 6 milhões com descontos sobre aposentados. Não lucrou mais com o esquema porque ganhou o contrato no início de 2024, assinado pelo ex-diretor de Benefícios, André Fidelis, demitido em julho do ano passado após as reportagens do Metrópoles.

Fidelis, segundo a PF, recebeu quantias milionárias do lobista Antonio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS, que representava entidades para firmar seus acordos com o órgão federal. O lobista recebeu pagamentos de Anderson Ladeira, presidente da AASPA.

Ladeira preside a entidade e é dono da empresa Dataqualify, responsável pelas fichas de filiação e biometria dos aposentados ligados à entidade. Essas assinaturas e fichas não têm sido aceitas pela Justiça como prova de filiações quando aposentados reclamam terem sido filiados à revelia pela AASPA.

Segundo os juízes, em sentenças que condenam a entidade, as fichas vem desacompanhadas de dados básicos para verificar sua autenticidade.

Além da Power Bi e da Dataqualify, a Controladoria-Geral da União também investiga fichas de filiações confeccionadas pela Confia, que é contratada pelo Sindnapi, sindicato que tem Frei Chico, irmão do presidente Lula, como dirigente, e a Anapps, que faturou R$ 127 milhões.

O Metrópoles tentou contato com as empresas de biometria citadas e as entidades que as contrataram, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto a manifestações.

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