Presidente da Câmara vira meme ao cair na armadilha do gancho visual na comunicação política
A publicação do presidente da Câmara dos Deputados, deputado Hugo Motta, em homenagem ao Dia dos Professores, ilustra um erro recorrente da comunicação política contemporânea: a tentativa de substituir conteúdo por impacto visual. O deputado tentou pegar carona na postagem da terceira mulher brasileira mais seguida no Instagram, Virgínia Fonseca, com 53,6 milhões de […]

A publicação do presidente da Câmara dos Deputados, deputado Hugo Motta, em homenagem ao Dia dos Professores, ilustra um erro recorrente da comunicação política contemporânea: a tentativa de substituir conteúdo por impacto visual. O deputado tentou pegar carona na postagem da terceira mulher brasileira mais seguida no Instagram, Virgínia Fonseca, com 53,6 milhões de seguidores. A imagem usada por Motta foi semelhante à que a influenciadora publicou ao ser pedida em namoro pelo jogador Vinícius Júnior, uma postagem que ultrapassou 10 milhões de curtidas e 1,2 milhão de comentários.
Ao postar uma foto que simulava um quarto romântico, com pétalas de rosa e balões em forma de coração, o deputado pretendia celebrar a aprovação de uma proposta voltada à valorização dos professores e servidores públicos. Mas o efeito foi o oposto: o conteúdo virou motivo de piada e constrangimento.
O episódio sintetiza o que Guy Debord (1967) chamou de “sociedade do espetáculo”, em que a representação suplanta a realidade e o gesto simbólico substitui o conteúdo político. Na lógica das redes, o que deveria comunicar uma conquista legislativa se transforma em um frame estético pensado para gerar engajamento efêmero, um exemplo de como a comunicação política digital se rende à disputa pelos “três segundos de atenção” e à estética da viralização.
O prefeito de Sorocaba é outro exemplo: tornou-se o rei dos ganchos visuais atrelados ao assunto do momento. O problema é o custo disso para sua autoridade e a falta de conexão de alguns desses temas com a imagem e a marca da figura política.
Ou seja, o caso de Motta não é um desvio isolado, mas expressão de um processo mais amplo de midiatização da política, descrito por Jesper Strömbäck. As plataformas digitais, guiadas por visibilidade, emoção e instantaneidade, passaram a orientar o comportamento dos atores políticos. Nesse contexto, a comunicação se converte em performance: o político precisa parecer comunicar, mais do que comunicar algo.
A publicação repete uma fórmula comum do marketing digital: o uso do “gancho visual” como estratégia para capturar atenção em um ambiente saturado de estímulos. Entretanto, ao deslocar o foco da mensagem pública para o recurso imagético, a postagem cai no que Rubim (2022) chama de “vazio simbólico da comunicação política”, a substituição do discurso por signos desconexos de sua função institucional.
Na comunicação política, toda escolha estética é também uma escolha discursiva. O erro de Hugo Motta não está apenas no tom inadequado, mas na falta de coerência entre forma e propósito. Ao adotar uma estética associada à intimidade e ao entretenimento, o discurso se dissolve no ruído do cotidiano digital, um sintoma do “governo do espetáculo”, em que a emoção substitui a razão pública.
O caso de Hugo Motta é um alerta: a política perde densidade quando se orienta pela lógica algorítmica da viralização. Ao transformar a comunicação em espetáculo, perde-se o espaço da argumentação e do diálogo. O desafio, portanto, não é vencer a briga por segundos de atenção, mas reconstruir o vínculo entre forma, conteúdo e propósito público.
O algoritmo pode recompensar o engajamento, mas o eleitor continua recompensando o sentido.
Vanessa Marques – jornalista
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