“Recebi, como todos receberam”, diz deputado que denunciou orçamento secreto
À PF, parlamentar admite recebimento de emendas e afirma que não fez acusações nem apontou crimes
Em entrevista à coluna, o deputado José Rocha (União-BA) admitiu ter recebido recursos do chamado orçamento secreto, prática que afirmou ser comum a todos os parlamentares.
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José Rocha é o principal denunciante da investigação do Supremo Tribunal Federal que investiga a distribuição do orçamento secreto. Em depoimento à PF, ele acusou o deputado Arthur Lira (PP-AL), então presidente da Câmara, de usar o mecanismo para beneficiar Alagoas e apontou sua então assessora Mariangela Fialek, a Tuca, como operadora do alagoano.
O deputado classificou como “maldade” ser chamado de delator do processo relatado pelo ministro Flavio Dino.
A coluna revelou que José Rocha tentou direcionar sozinho R$ 152 milhões do orçamento secreto, dos quais R$ 88 milhões para sua base eleitoral, a Bahia. Pelo acordo de líderes, os recursos deveriam atender deputados de todos os partidos.
Como foi sua conversa com o Lira?
Ele disse que tinha um acordo com os líderes (sobre quais deputados poderiam indicar recursos do orçamento da Comissão de Integração Nacional, à época presidida por José Rocha). Se teve acordo ou não (de líderes), é ele quem vai dizer, não sou eu. E também falou que eu estava criando problema (ao não encaminhar a lista com os nomes desses deputados para o governo).
Problema para quem? Não sei.
Com os líderes? Eu não disse que era com os líderes, não. Você está botando coisa na minha boca.
Na sua versão, o Lira disse que o senhor estava criando problemas. O senhor não perguntou para quem? Não. Por que é que eu tenho que perguntar?
Não seria óbvio? É óbvio para você. Para mim, não é.
O senhor fez uma lista paralela? Eu não fiz.
No seu depoimento, o senhor diz que recebeu do Lira uma lista de indicação de emendas, que o Lira ligou para o senhor e cobrou que o senhor não estava mandando a lista para o ministério. Não é verdade. Não tem isso no depoimento.
Qual a denúncia que o senhor fez? No meu depoimento, eu disse que recebi as listas da presidência da Casa, com uma planilha e um ofício prontos para mandar para o ministério.
O senhor mandou para o ministério? A primeira lista eu mandei exatamente como estava.
E o que ocorreu depois disso? Depois disso, veio uma segunda, em que tinha R$ 320 milhões para Alagoas, sem dizer o que era, e eu segurei.
O senhor não mandou a lista para o ministério? Retive a lista toda. Justamente.
Qual o volume total de recursos dessa segunda lista? Não me lembro.
E como o senhor redistribuiu esses recursos da segunda lista? Não tinha recurso. Tinha uma relação de indicações.
Mas as indicações eram acompanhadas de um valor… Correto.
O senhor pegou esses valores e fez o quê? Retive.
E o que ocorreu com essas emendas? Não sei.
Mas o senhor era o presidente da comissão… Não sou eu que executo emenda de comissão.
Mas é o senhor, como presidente da comissão, que tinha que mandar para o governo os nomes dos deputados e para onde o dinheiro deveria ser destinado. Sou eu quem administra recurso de comissão?
Como presidente da comissão, é o senhor quem manda a lista para o governo pagar… Eu mando a lista. É o ministério quem paga. Eu retive a lista.
O senhor reteve a lista do Lira e os recursos foram encaminhados para quem? Não sei.
O dinheiro das emendas ficou sem uso? Não sei.
Mas o senhor era o presidente da comissão… Presidente de comissão não mexe com recurso.
Quem manda a lista é o presidente da comissão, deputado… O senhor refez a lista que recebeu do Lira? Não, senhora. Quem mexe com recursos é o ministério.
Mas o ministério coloca o dinheiro da cabeça dele (sem ouvir a Câmara)? Claro que não.
Mas, se a lista não foi enviada, o que ocorreu com essas emendas? Como é que eu vou saber?
O senhor não sabia o que ocorria na comissão? Isso não tem nada a ver com a comissão.
Quanto tinha de dinheiro? Não sei.
O senhor só se recorda do valor para Alagoas, R$ 300 milhões? Não. Eu não sei só o de Alagoas, não. Você está dizendo que eu sei só de Alagoas, e isso não é verdade.
Então me diga: quanto foi para São Paulo? Não sei quanto tinha.
Quanto tinha para a Bahia? Não sei.
Quanto tinha para o Ceará? Não sei. Está na lista.
Quanto tinha para o Rio de Janeiro? Não sei.
O Lira mandou a segunda lista e o senhor disse que reteve. Esse valor das emendas da segunda e da terceira lista o senhor mandou para onde? Como é que eu vou saber o que foi feito com o dinheiro?
O senhor disse que reteve a lista do Lira… O que foi feito com o dinheiro? Quando eu retive, a Piauí me fez uma entrevista. O Dino leu a reportagem e mandou bloquear todas as emendas de comissão que não tivessem identificação. Eu fui ao Dino e disse que havia emendas que estavam identificadas. Ele me disse: “As que estão identificadas você manda para o ministério, que manda para a CGU, que eu autorizo todas”. As que tinham identificação eu mandei para o ministério, e o Dino autorizou pagar todas.
As que tinham identificação eram da lista do Lira? A lista veio do presidente.
A lista do presidente tinha identificação? Algumas. Como essa de Alagoas não tinha.
Dos R$ 1,125 bilhão, quanto tinha identificação? Não sei.
O senhor diz que nunca fez uma lista própria? Nunca fiz lista.
O Elmar Nascimento, líder do União à época, nunca cobrou do senhor que respeitasse o acordo de líderes? Não. Não tratei com Elmar sobre isso.
O senhor recebeu emendas do orçamento secreto? Sim. Recebi, como todos receberam. Não é José Rocha, não. Eu e todos recebemos.
As suas emendas estavam identificadas? Estavam identificadas.
Qual era o papel da Mariangela Fialek (Tuca) nesse processo? A Tuca não manda dinheiro para ninguém. Ela envia as planilhas que o presidente determina que ela envie. Tuca não manda dinheiro, não manda emenda para ninguém. Ela é apenas uma funcionária que recebe ordem do presidente.
E o senhor vê crime nisso? Eu não. Nenhum.
O senhor acusa o Lira de participar de esquema de corrupção? Nunca acusei.
E a Tuca? Também nunca acusei.
O que tem de ilegal no que o senhor narrou para a PF? Quem disse que tem algo ilegal? Não faço juízo de valor. Eu depus o que a polícia me perguntou. A minha indignação é com uma matéria que me coloca como delator. Repilo isso veementemente. Nunca fiz nada errado na minha vida. Tenho 12 mandatos de deputado, não tenho denúncia, processo. Não é a mesma coisa de Arthur Lira. Minha história não se combina com a de Lira.
O senhor tem alguma questão pessoal com Lira? Não. Ele é que tem comigo. A história é que eu, como membro da Comissão de Relações Exteriores, fui selecionado para a COP. Ele não despacha meu nome para ir à COP. Eu perguntei a ele, ele disse que já tinha autorizado 30 deputados e não autorizaria mais ninguém. Eu levantei, saí e nunca mais falei com ele. Só quando ele me ligou para falar da lista, dizendo que eu estava criando problema.
O senhor deixou de falar com ele porque ele não autorizou sua viagem? Não.
O senhor deixou de falar com ele por quê? Porque eu não quis. Não tenho que dar satisfação.
O senhor considera um inimigo do Lira? Não. Ele é que deve me ter como inimigo, eu não.
Que sentimento o senhor ficou com relação a isso? Nenhum.
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