Como o papa Leão 14 se relaciona com a América Latina
Por DW Ao ser apresentado ao mundo como o novo líder da Igreja Católica, na sacada central da Basílica de São Pedro, no Vaticano, Robert Francis Prevost surpreendeu ao escolher, além do italiano, o espanhol para dar seu recado inaugural. Nesse momento, saudou a diocese de Chiclayo, no Peru, “onde um povo fiel acompanhou seu bispo, compartilhou sua […]


Por DW
Ao ser apresentado ao mundo como o novo líder da Igreja Católica, na sacada central da Basílica de São Pedro, no Vaticano, Robert Francis Prevost surpreendeu ao escolher, além do italiano, o espanhol para dar seu recado inaugural. Nesse momento, saudou a diocese de Chiclayo, no Peru, “onde um povo fiel acompanhou seu bispo, compartilhou sua fé e deu muito, muito para continuar sendo a Igreja fiel de Jesus Cristo”.
Nascido em 1955, em Chicago, nos Estados Unidos, Leão 14 é o segundo papa vindo do continente americano, depois de seu antecessor, o argentino Francisco (Jorge Mario Bergoglio), de quem era próximo. Grande parte de sua trajetória missionária aconteceu no Peru, onde trabalhou por duas décadas e ganhou cidadania.
Um clima de festa tomou conta do país com o anúncio e a fala em espanhol do pontífice. “O papa Leão é peruano, Deus ama o Peru”, comemorou a presidente do país, Dina Boluarte.
O núncio apostólico no Peru, Paolo Rocco Gualtieri, disse que o papa “é mais peruano do que americano”. “Acho que todos os peruanos receberam essa bela notícia com grande alegria”, disse Gualtieri a repórteres após a eleição de Prevost como o novo pontífice.
De Chicago para Chiclayo
Prevost viveu a infância e a adolescência em Chicago com os pais e seus dois irmãos. Iniciou a vida religiosa aos 22 anos, na ordem de Santo Agostinho. Formou-se em teologia e em matemática, e, aos 27 anos, foi enviado por seus superiores a Roma para estudar direito canônico na Universidade de São Tomás de Aquino. Lá, foi ordenado padre, em 1982.
Sua história com o Peru começou em 1985, quando foi enviado à sua primeira missão no país, na cidade de Chulucanas, na região de Piura, onde permaneceu por três anos. Mas esse chamado veio antes, segundo o próprio papa.
Prevost revelou, em 2023, quando foi condecorado pela Conferência Episcopal Peruana, que seu vínculo com o país começou quando ele tinha cinco anos de idade. “Eu tinha um tio que trabalhava aqui e ele me deu um chullo (chapéu de lã andino) com todas as cores, e minha educação peruana começou em uma idade muito tenra”, disse na época.
Em 1988, mudou-se para Trujillo, um pouco mais ao sul, para coordenar, inicialmente, um projeto de formação religiosa. Permaneceu na cidade até 1999, ocupando diversos cargos, até ser enviado de volta a Chicago.
Em 2014, o papa Francisco o designou administrador apostólico da diocese peruana de Chiclayo – cidade situada no meio do caminho entre Chulucanas e Trujillo – e, no ano seguinte, o nomeou bispo. Como um sinal de compromisso com o país, ele anunciou então que se tornaria cidadão peruano, o que foi efetivado em 2015.
Ele permaneceu em Chiclayo até janeiro de 2023, quando o papa Francisco o chamou a Roma para assumir os postos de prefeito do Dicastério para os Bispos, um dos cargos mais influentes do Vaticano, e de presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina, promovendo-o a arcebispo.
“Eu vivo a alegria e o orgulho de me sentir muito identificado com o povo peruano”, disse na época, acrescentando que sentiria falta da comida local – citando o ceviche, o cabrito e outras especialidades.
No período em que viveu no Peru, Prevost esteve ao menos três vezes no Brasil. Em 2013, ele participou da Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, e esteve também em São Paulo. Em 2008, visitou uma igreja em Campinas. Em 2004, participou de uma solenidade no Colégio Santo Agostinho, em Belo Horizonte, onde provou da culinária mineira – ele aparece numa foto servindo um prato de frango com quiabo.
Em 2023, depois de o ex-presidente Alberto Fujimori ser solto da cadeia em função de um perdão humanitário recebido do Judiciário, Prevost sugeriu que ele deveria pedir perdão a cada uma das vítimas do seu governo para iniciar um processo de reconciliação. Fujimori cumpria pena de 25 anos de prisão por crimes contra humanidade ocorridos durante sua gestão.
Trabalho com os mais pobres e polêmica
Durante seu trabalho pastoral em Chiclayo, Prevost esteve envolvido com as comunidades mais vulneráveis, especialmente nas áreas rurais. Ele promoveu iniciativas sociais destinadas a melhorar a qualidade de vida da população, incluindo programas voltados para a redução da desnutrição infantil.
Mas sua passagem pelo Peru rendeu-lhe também críticas. Durante seu trabalho como bispo em Chiclayo, Prevost foi acusado de ter protegido padres que teriam cometido abuso sexual contra fiéis, o que não foi provado.
De acordo com a diocese, em 2022, três jovens denunciaram o ex-padre Eleuterio Vásquez González, que foi afastado do sacerdócio. Em alguns meses, a investigação preliminar foi concluída, e Prevost enviou o arquivo das investigações para o órgão competente da Cúria Romana para alegações de abuso sexual de menores pelo clero.
Em 2023, o órgão informou aos denunciantes que o caso foi encerrado, pois havia prescrito. Uma das denunciantes recorreu da decisão, e o então bispo de Chiclayo (na época, Prevost já havia sido transferido para Roma), Guillermo Cornejo, decidiu reabrir o caso.
Possíveis origens crioulas
O novo papa também tem raízes crioulas, da cidade de Nova Orleans, de acordo com investigação do jornal americano The New York Times.
Seus avós maternos, ambos descritos como negros ou mulatos em vários registros históricos, viviam numa área tradicionalmente católica da cidade, um caldeirão de influências africanas, caribenhas e europeias, aponta o jornal.
Os avós, Joseph Martinez e Louise Baquié, mudaram-se para Chicago no início do século 20 e tiveram uma filha: Mildred Martinez, a mãe do papa.
As informações foram levantadas pelo genealogista de Nova Orleans Jari C. Honora e confirmadas pelo jornal com irmão mais velho do papa, John Prevost, 71 anos, morador de Chicago.
“Essa descoberta é apenas mais um lembrete de como estamos entrelaçados como nação”, disse Honora.
“Espero que ele destaque a longa história dos católicos negros, tanto livres quanto escravizados, neste país, o que inclui a família do santo padre.”
sf/bl (efe, ots)
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