Rastros deixados por aviões podem aquecer o planeta mais que o CO2
Pesquisa mostra que os rastros de condensação, chamados de contrails, respondem por cerca de 15% do impacto climático da aviação
A aviação contribui para o aquecimento global não apenas por meio das emissões de dióxido de carbono (CO2). Um estudo publicado em 29 de setembro na revista científica Nature Communications mostra que as trilhas brancas deixadas por aviões no céu, conhecidas como contrails, também têm um impacto climático relevante e respondem por cerca de 15% do custo social total associado ao aquecimento causado pela aviação.
O que são as contrails ?
As contrails se formam quando o vapor d’água liberado pelos motores das aeronaves entra em contato com camadas frias e úmidas da atmosfera, transformando-se em cristais de gelo.
Em algumas situações, essas trilhas se dissipam rapidamente. Em outras, persistem por horas e se espalham, formando nuvens finas semelhantes aos cirros naturais. Essas nuvens artificiais interferem diretamente no equilíbrio térmico do planeta.
Elas refletem parte da radiação solar de volta ao espaço, o que poderia ter um efeito de resfriamento, mas também retêm o calor que a Terra emite, funcionando como um “cobertor térmico”.
Segundo os autores do estudo, o efeito líquido costuma ser de aquecimento, especialmente durante a noite, quando não há luz solar para compensar esse processo.
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Como os cientistas mediram o impacto climático
Para calcular esse impacto, os pesquisadores analisaram dados de quase 500 mil voos sobre o Atlântico Norte, combinando informações atmosféricas detalhadas, modelos climáticos e ferramentas econômicas.
O objetivo foi estimar o chamado custo social, um indicador que traduz os danos econômicos futuros provocados pelas mudanças climáticas, como prejuízos à saúde, à agricultura e à economia global.
O estudo utilizou um modelo climático-econômico que permite comparar os efeitos de diferentes fatores climáticos, incluindo tanto as emissões de CO2 quanto as contrails. Os cientistas testaram vários cenários de aquecimento global e diferentes formas de valorar os impactos futuros.
Quanto as contrails pesam no aquecimento global
Os resultados mostram que o custo anual associado às contrails pode variar de US$ 4,3 bilhões a US$ 410 bilhões, dependendo do cenário climático analisado. Já os custos relacionados às emissões de CO2 da aviação variam de US$ 23 bilhões a US$ 1,6 trilhão por ano.
No cenário considerado mais provável pelos autores, as contrails respondem por aproximadamente 15% do impacto climático total da aviação. Embora o efeito dessas trilhas dure apenas algumas horas na atmosfera, ele é intenso o suficiente para gerar consequências relevantes quando somado ao grande volume de voos diários no mundo.
Trilhas brancas deixadas por aviões podem reter calor na atmosfera e intensificar o aquecimento global, aponta estudo
Nem todos os voos aquecem da mesma forma
Um dos achados mais importantes do estudo é que nem todas as contrails têm efeito de aquecimento. Cerca de 38% dos voos analisados formaram contrails que contribuíram para o aquecimento, enquanto outros tiveram impacto neutro ou até ligeiramente resfriador, dependendo das condições atmosféricas.
Isso significa que o impacto climático da aviação não é uniforme e pode variar conforme a rota, a altitude e o horário do voo. Segundo os pesquisadores, pequenas mudanças na trajetória das aeronaves para evitar regiões da atmosfera mais favoráveis à formação de contrails persistentes poderiam reduzir o impacto climático total, mesmo que isso gere um pequeno aumento no consumo de combustível.
O que muda para a aviação e para as políticas climáticas
Ao quantificar economicamente o impacto das contrails, o estudo amplia a discussão sobre os efeitos climáticos da aviação além do CO2. Os autores defendem que políticas públicas e estratégias do setor aéreo precisam considerar também esses impactos de curto prazo, enquanto tecnologias mais limpas ainda estão em desenvolvimento.
A pesquisa sugere que ajustes operacionais relativamente simples podem ajudar a reduzir o impacto climático do transporte aéreo, tornando as decisões sobre rotas e altitudes parte das estratégias de enfrentamento das mudanças climáticas.
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