Suspeito de fraude milionária, “advogado do além” criou banco digital
A plataforma de serviços financeiros não aparece na lista de instituições autorizadas, reguladas ou supervisionadas pelo Banco Central

Uma apuração exclusiva da coluna pode ligar o advogado Daniel Fernando Nardon (foto em destaque) a mais uma série de crimes. Investigado por liderar um esquema de fraudes que lesou aposentados, servidores públicos e até pessoas mortas ou em estado vegetativo, Nardon teria fundado, em março deste ano, um banco digital denominado “Nardon Bank”. A plataforma de serviços financeiros digitais não aparece na lista de instituições autorizadas, reguladas ou supervisionadas pelo Banco Central do Brasil.
Alertado pela coluna, o delegado Vinicius Nahan, titular da 2ª Delegacia de Polícia (2ª DP) e responsável pela investigação, informou que o banco digital entrará, agora, na rota das investigações. O banco está em nome do filho do advogado.
As apurações também revelaram que o Nardon Bank não aparece na lista de participantes do Pix. O documento é regulado pelo Banco Central e fica exposto no site da autarquia federal como forma de alertar a população para que confiram se a instituição que oferece a abertura de conta, produto ou empréstimo está cadastrada no BC para, assim, evitar golpes.
No site do banco, a empresa supostamente clandestina se intitula como “parceira digital na gestão inteligente das finanças” e afirma ter mais de 5 mil clientes, até o momento.
Extensa lista de crimes
A Polícia Civil do Rio Grande do Sul já apurava outros diversos crimes em que teriam sido cometidos por Nardon.
De acordo com os investigadores, Nardon era o cérebro de um grupo criminoso que falsificava procurações, contraía empréstimos em nome de terceiros e ajuizava ações sem o conhecimento dos próprios autores, muitos deles mortos, incapacitados ou alheios à existência do processo.
Segundo a investigação, o escritório chegou a ajuizar mais de 145 mil ações judiciais, sendo 112 mil no Rio Grande do Sul e 30 mil em São Paulo, quase sempre com o mesmo padrão usando documentos padronizados, comprovantes de residência clonados e múltiplas ações em nome da mesma pessoa. Em alguns casos, uma única vítima somava até 30 ações.
Enquanto os clientes acreditavam estar entrando com processos para reduzir juros abusivos, o grupo usava procurações em branco para contratar novos empréstimos em nome das vítimas.
O dinheiro era depositado na conta delas, e os fraudadores se apresentavam como os responsáveis pela “vitória” judicial, cobrando honorários de até 30% do valor. Ao mesmo tempo, embolsavam também os valores obtidos nas ações ajuizadas — quase sempre sem o consentimento dos clientes.
Nardon chegou a ajuizar 581 processos em um único dia. Segundo o delegado Vinicius Nahan, o advogado é, hoje, um dos cinco maiores litigantes do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
As vítimas eram, na maioria, servidores públicos, professores, aposentados e militares.
Após a operação, a seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio Grande do Sul suspendeu temporariamente a licença do advogado. A decisão ocorreu após análise do inquérito policial por parte da OAB/RS.
Vida luxuosa
A investigação conduzida pela Polícia Civil do Rio Grande do Sul, no âmbito da Operação Malus Doctor, mostrou que o padrão de vida mantido por Nardon e seus comparsas era sustentado pelo esquema fraudulento que pode ter movimentado R$ 50 milhões.
Apesar de ser apenas advogado na teoria, as investigações apontam que ele financiava empreendimentos milionários, como um condomínio de 17 casas na zona sul de Porto Alegre, onde cada unidade está avaliada em R$ 850 mil. O empreendimento foi construído com recursos que, segundo a polícia, têm origem direta no esquema criminoso supostamente comandado por Nardon.
Além do condomínio, o grupo mantinha ativos na bolsa de valores e negociava um prédio de R$ 10 milhões no bairro Menino Deus. A ostentação também se refletia na garagem, além do Maserati, foram localizados veículos de alto padrão como BMW e Mercedes, todos vinculados ao núcleo principal ou às empresas de fachada utilizadas para lavar dinheiro.
Esquema de família
As investigações apontam que familiares de Nardon estavam cientes do esquema e teriam, inclusive, participado, em certos momentos. Na operação dessa quinta-feira (8), a esposa e a cunhada dele foram detidas com munições de uso restrito e R$ 16 mil em espécie.
A esposa foi presa em flagrante. Além das prisões, a polícia cumpriu 74 mandados judiciais, bloqueou contas bancárias dos 14 investigados, incluindo nove advogados, e apreendeu cinco veículos de luxo. Até o momento, a Polícia Civil estima que ao menos 10 mil pessoas tenham sido lesadas.
Nessa sexta-feira (9/5), a Justiça pediu pela prisão preventiva do advogado. Ele é considerado foragido.
A coluna tentou contato com o escritório de advocacia de Nardon, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto para manifestações.
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