Em site de reclamações, vítimas relatam fraudes no INSS desde 2016
Nos últimos nove anos, beneficiários do INSS registram queixas sobre descontos de valores indevidos em aposentadorias e pensões

A existência de uma organização criminosa que aplicava descontos irregulares de mensalidades a aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), revelada por investigação da Polícia Federal e reportagens do Metrópoles, vinha sendo alvo de reclamações em sites, como o Reclame Aqui, desde 2016.
Em registro de novembro daquele ano, uma pessoa reclamou no perfil atribuído ao INSS, no site, informando que vinha sofrendo descontos não autorizados, desde agosto. “Peço o estorno de todas as contribuições descontadas e a imediata exclusão do desconto”, escreveu. Veja:

Nas últimas semanas, desde que o escândalo resultou na Operação Sem Desconto, deflagrada pela PF em 23 de abril, centenas de pessoas lesadas começaram a registrar novas queixas no site, apresentando-se como vítimas do esquema.
O perfil do INSS, na página, embora não oficial, foi alvo de diversos relatos, ao longo dos últimos nove anos, com questões relacionadas a cartões e outros serviços. A maioria das queixas, no entanto, tem sido de beneficiários que denunciam os tais descontos indevidos em seus benefícios.
Relatos das vítimas
Em uma reclamação publicada há 23 dias — pouco mais de duas semanas antes da operação da PF —, um beneficiário relata que recebe pensão do INSS, mas identificou um desconto feito por uma entidade associativa ou sindicato sem a autorização dele. Segundo o relato, mesmo com o benefício bloqueado para esse tipo de desconto, a cobrança continuava.
“Gostaria de saber o que o INSS irá fazer pra (sic) resolver e fazer a restituição dos valores cobrados após o bloqueio do mesmo. Desde já agradeço pela atenção e obrigado”, escreveu o beneficiário de Nova Iguaçu (RJ). Veja:
Um outro beneficiário, agora de São Gonçalo (RJ), registrou uma reclamação no site em 15 de abril, relatando que o INSS fez descontos no benefício dele, entre abril e dezembro de 2024, sem a devida autorização.
Segundo ele, embora o INSS tenha cancelado os descontos após a queixa, orientou que a devolução dos valores fosse tratada diretamente com a União Nacional de Auxílio aos Servidores Públicos (Unaspub) — entidade que foi alvo de operação da PF na última semana. No entanto, a restituição nunca foi realizada.
“Ao identificar a cobrança, entrei em contato com o INSS, que fez o cancelamento, mas não restituiu o valor descontado, apenas pediu para que eu (sic) entrasse em contato com a Associação. A Unaspub deu um prazo de 60 dias úteis para fazer a restituição do valor, e esse prazo já passou, e eles não restituíram o dinheiro. Terei de ir para a Justiça”, escreveu o beneficiário.
Mulher notou desconto após reportagem do Metrópoles
Em outro caso, a beneficiária relatou que percebeu descontos indevidos em sua aposentadoria após ler uma reportagem publicada no Metrópoles, na coluna de Tácio Lorran.
Segundo ela, a matéria citou que a Associação Brasileira de Defesa dos Clientes e Consumidores de Operações Financeiras e Bancárias (Abradeb) havia ingressado com uma ação na Justiça Federal contra o INSS, em razão de descontos indevidos realizados por associações em benefícios previdenciários.
A partir dessa publicação, a beneficiária passou a conferir seus extratos e identificou os descontos mencionados.
“O que acontece é que está sendo descontado da minha pensão o valor de mais de R$*** (ocultado pelo site) de um tal de sindicato.. (sic) Nunca me associei a isso, muito menos assinei para tal. Já tentei fazer o cancelamento pelo app diversas vezes, e não consegui. Não posso resolver fisicamente pq (sic) estou fora do país”, contou.
“Só que até agora não recebi os descontos como também não pararam de cobrar. Já pago quase R$ 1 mil de empréstimos há muitos anos e ainda acham pouco e vêm me cobrar tudo isso. Indignada”, completou.
Perfil não oficial
O perfil do INSS no Reclame Aqui não é oficial e não é administrado pelo governo federal. Apesar de reunir manifestações quase diárias — especialmente após a operação que “alertou” a população —, nenhuma reclamação registrada na página foi respondida desde que o perfil foi criado.
Para descobrir se teve valores descontados, o aposentado ou pensionista deve consultar o extrato do INSS — onde estarão todas as retiradas, tanto de crédito consignado como de mensalidades associativas.
A Advocacia-Geral da União (AGU) formou um grupo de trabalho para analisar o pedido de restituição dos valores as entidades envolvidas.
As investigações da PF apontam que os prejuízos com os descontos indevidos podem chegar a R$ 6,3 bilhões. As apurações prosseguem.
Farra no INSS
Conforme mostrou o Metrópoles, o esquema de fraude nos descontos de mensalidade sobre aposentados do INSS, alvo de operação da PF há mais de uma semana, impactou “direta e negativamente” a fila de espera de benefícios e causou prejuízo operacional de R$ 5,9 milhões ao próprio INSS em menos de dois anos, segundo as investigações conduzidas pela PF e pela CGU.
De acordo com a PF, entre janeiro de 2023 e maio de 2024, auge da farra dos descontos indevidos, o INSS recebeu 1,9 milhão de pedidos de exclusão ou bloqueio de mensalidade associativa, feitos por aposentados que foram filiados sem consentimento a entidades que cobram um valor mensal direto da folha de pagamento dos segurados em troca de supostas vantagens em serviços, como plano de saúde.
A ação da PF, batizada de Sem Desconto, foi deflagrada em 23/4 e resultou no afastamento de membros da cúpula do órgão. No mesmo dia, Lula demitiu o então presidente do instituto, Alessandro Stefanutto. Lupi havia indicado o profissional. A fraude também resultou na queda do ministro da Previdência Social, Carlos Lupi (PDT).
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