Farra do INSS: quem são os envolvidos nos governos Lula e Bolsonaro
Fraudes dos descontos contra aposentados atingiram membros das gestões Lula e Bolsonaro, que tiveram papel complementar no escândalo do INSS

São Paulo — O escândalo envolvendo a farra dos descontos indevidos de aposentados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) atingiu nomes do primeiro e segundo escalões dos governos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Entusiastas de ambas as gestões tentam agora jogar no colo do adversário o ônus total do caso, que foi alvo de uma megaoperação da Polícia Federal (PF) e de pedido de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso.
A farra do INSS foi revelada pelo Metrópoles em uma série de reportagens publicadas a partir de dezembro de 2023. Três meses depois, o portal mostrou que a arrecadação das entidades com descontos de mensalidade de aposentados havia disparado, chegando a R$ 2 bilhões em um ano, enquanto as associações respondiam a milhares de processos por fraude nas filiações de segurados.
As reportagens do Metrópoles levaram à abertura de inquérito PF e abasteceram as apurações da Controladoria-Geral da União (CGU). Ao todo, 38 matérias do portal foram listadas na representação que deu origem à Operação Sem Desconto, deflagrada no dia 23/4 e que culminou nas demissões do presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e do ministro da Previdência, Carlos Lupi.
Como a reportagem apurou, as entidades da farra dos descontos atuaram nos dois governos, marcados pelo aumento do número de associações agraciadas com acordos com o INSS que permitiam a cobrança de mensalidade direto da folha de pagamento dos aposentados.
No governo de Bolsonaro, o INSS foi loteado pelo Centrão e foram abertas as portas para entidades suspeitas. Enquanto que na gestão Lula, mais associações firmaram acordo e o faturamento com descontos de mensalidade disparou.
Ambos os governos receberam alertas de fraude e chegaram até a reabilitar entidades que já haviam sido expulsas pelo INSS. No caso da gestão Lula, foram ignorados alertas de auditorias durante todo o período que precedeu a Operação Sem Desconto, deflagrada pela PF.
Veja o que pesa sobre integrantes de cada um dos governos
Governo Lula
- Carlos Lupi (PDT) — ministro da Previdência Social desde o início da gestão, em 2023, pediu demissão nove dias após a operação da PF contra as fraudes dos descontos no INSS. O pedetista não foi citado nas investigações, mas a permanência dele no cargo ficou insustentável diante de tantos alertas feitos sobre o esquema — seja em reportagens, seja em uma reunião do Conselho Nacional do INSS, em junho de 2023 — e de nenhuma providência efetiva tomada.
- Wolney Queiroz (PDT) — era o número 2 do Ministério da Previdência e assumiu a pasta após a queda de Lupi. Esteve presente na mesma reunião em que o ex-ministro foi alertado sobre as fraudes nos descontos. Quando era deputado federal, em 2021, Queiroz assinou uma emenda que flexibilizou os critérios para o desconto na folha de aposentados e pensionistas do INSS, como a prorrogação do prazo para revalidação do cadastro, que passou de um para três anos.
- Alessandro Stefanutto (PSB) — Era presidente do INSS desde julho de 2023, foi afastado do cargo por decisão judicial em 23/4, durante a Operação Sem Desconto, da qual foi alvo, e demitido por Lula no mesmo dia. É acusado de omissão no combate as fraudes dos descontos, que atingiram o auge em sua gestão. Em um caderno apreendido nas buscas envolvendo o lobista Antonio Carlos Camilo Antunes, o “Careca do INSS”, a PF encontrou anotações como “Stefa 5%” e “Virgílio 5%”, que sugerem suposto pagamento de propina a Stefanutto e ao ex-procurador do órgão Virgílio Oliveira Filho.
- André Fidelis — Foi diretor de Benefícios do INSS até julho de 2024, quando foi demitido após série de reportagens do Metrópoles. Chefiou o setor responsável pelos acordos com as entidades — ele assinou ao menos sete deles — no auge da farra dos descontos. A PF afirma que Fidelis recebeu R$ 5,1 milhões de empresas do “Careca do INSS” e de outras com ligação com entidades suspeitas, por meio do filho dele, o advogado Eric Fidelis.
Governo Bolsonaro
- José Carlos Oliveira (PSD) — Ministro da Previdência durante oito meses (março a dezembro de 2022) no governo Bolsonaro, ele foi presidente do INSS entre novembro de 2021 e março de 2022. Antes disso, foi diretor de Beneficios e assinou acordos com três entidades investigadas. Segundo a PF, no período em que Oliveira presidiu o INSS, “foram celebrados vários ACTs entre associações e INSS, para efetivação dos descontos associativos”. Filiado ao PSD, ele foi candidato a vereador em São Paulo em 2024 e recebeu doações de R$ 15 mil de Edson Yamada, que participou da coordenação de sua campanha, e da filha dele. Os doadores são sócios de uma empresa suspeita de receber recursos de Cícero Marcelino de Souza Santos, apontado como operador da Conafer, entidade que faturou R$ 484 milhões com descontos de aposentados entre 2019 e 2024.
- Onyx Lorenzoni (PL) — Ministro da Previdência entre julho de 2021 e março de 2022, foi citado na investigação da PF por ter recebido uma doação de R$ 60 mil de Felipe Gomes Macedo, quando foi candidato ao governo do Rio Grande do Sul, em 2022. Macedo foi dirigente da ABCB, quando a entidade iniciou o processo de acordo de cooperação com o INSS, na gestão Onyx. O acerto foi autorizado depois que o ex-ministro já tinha deixado o cargo. Onyx negou ter relação com o doador e disse que na transição com o governo de Michel Temer, foi descoberto um esquema fraudulento com quatro associações que tiveram os acordos com o INSS bloqueados, em agosto de 2019. No entanto, uma delas, a ANAPPS retomou, em setembro de 2021, quando Onyx era ministro, a autorização para fazer descontos após trocar de nome.
- Edson Yamada — Foi designado diretor de Benefícios do INSS em junho de 2022. Na diretoria responsável pela celebração de acordos com as entidades, assinou ao menos oito deles com associações envolvidas nas fraudes. Ele é citado nas investigações por ser sócio da “Yamada e Hatheyer Servicos Administrativos LTDA”, com Yasmin Oliveira, filha de José Carlos Oliveira, ministro da Previdência entre março e dezembro de 2022. A empresa recebeu repasses da Conafer, uma das entidades investigadas no esquema, por meio de José Laudenor, um outro sócio que, segundo a PF, faz movimentações financeiras incompatíveis com a sua renda.
- Virgílio Oliveira Filho — Procurador-geral afastado do cargo no INSS pela Justiça no dia da operação da PF, ele é apontado como recebedor de R$ 11,9 milhões de empresas relacionadas a entidades associativas investigadas. Depois, a Advocacia-Geral da União (AGU), órgão do qual é funcionário de carreira, determinou sua exoneração. Do total rastreado, cerca de R$ 7,5 milhões têm como fonte empresas ligadas ao lobista “Careca do INSS”. Virgílio Oliveira Filho havia assumido como procurador-geral do INSS em 2020 e continuou no governo Lula.
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