INSS: entidades escolhiam amostra de aposentados para fiscalização
Auditoria do órgão aponta “dúvidas” quanto à utilidade de procedimentos de fiscalização de acordos para descontos de aposentados

A auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) sobre os Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) firmados entre entidades associativas e o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) mostra que eram as próprias associações que escolhiam a amostra de aposentados para que o INSS fizesse a fiscalização dos acordos.
O trabalho da CGU analisou diversos aspectos dos acordos, desde seu firmamento até os procedimentos de acompanhamento das cláusulas previstas nos ACTs.
A observação sobre a responsabilidade de escolha da amostra se deu durante a análise da Controladoria sobre a fiscalização desses acordos e com suspensão dos repasses. Segundo a CGU, no entanto, esse tipo de medida levanta dúvidas sobre a efetividade de tal inspeção pelo INSS, tendo em vista que as entidades seriam partes interessadas no procedimento.
“Observa-se que a amostragem, nos procedimentos instaurados para acompanhamento das cláusulas do ACT e com suspensão de repasses, foi definida a partir de livre escolha das entidades, partes interessadas no procedimento de fiscalização, situação que suscita dúvida quanto à utilidade e aos resultados desse procedimento”, diz trecho do documento.
Tais acordos estão no centro das apurações da “farra do INSS”, que investiga descontos indevidos nas folhas de pagamento de aposentados e pensionistas, e que resultou na operação Sem Desconto em abril deste ano.
A incerteza citada pela CGU tem especial relevância, segundo o órgão, dado o número de reclamações e denúncias que surgiram quanto a supostas irregularidades nos acordos.
O relatório aponta que a dúvida quanto à utilidade do procedimento se dá “sobretudo diante do elevado índice de conformidade atestado pela DIRBEN nos procedimentos realizados, em descompasso com reclamações e denúncias que vinham sendo apresentadas na ocasião, assim como com o quantitativo de solicitações de exclusão do desconto de mensalidade associativa e com a indicação de seu não reconhecimento”.
Prédio do INSS em Brasília
Para realizar a análise dos procedimentos de acompanhamento adotados pelo INSS, a CGU solicitou que o envio de todos os procedimentos de fiscalização realizados pelo órgão entre 2023 e 2024, período em que houve aumento “significativo” do quantitativo de descontos associativos implementados, com impacto no montante dos valores descontados. Ao todo, foram analisados 34 processos.
Segundo o INSS, os procedimentos se assemelham a uma verificação de conformidade que levam em conta fichas de autorização e outros elementos considerando os critérios estabelecidos nos ACTs.
A partir disso, foram identificados processos com suspensão cautelar de novas adesões de associados devido ao aumento de descontos, solicitações de fichas relativas às inclusões de descontos, e outros com motivações diversas, como reclamações registradas no Fala.BR, representações no Ministério Público Federal e outros.
Dentro desses escopo, a “dúvida” suscitada pela CGU é quanto aos procedimentos instaurados para acompanhamento das cláusulas dos ACTs e com a suspensão de repasses.
Em outra frente, a Controladoria também aponta outras lacunas dentro desses processos de verificação de conformidade, a exemplo de documentos ilegíveis, mas que foram atestados pelo INSS como dentro da conformidade.
“Adicionalmente, em que pese o INSS informar sobre a verificação minuciosa dos documentos apresentados, identificou-se a existência de documentos de identificação com fotos ilegíveis em análises cuja conformidade era de 100%, assim como em casos não identificados pelo INSS nas demais análises”, afirma a CGU.
A CGU conclui dizendo que, com base nos documentos analisados, observou-se “pouca efetividade desses procedimentos de fiscalização, pois, em grande parte, não foram identificados resultados de análise da documentação disponibilizada”.
“O fato de a amostra de beneficiários que teriam seus documentos submetidos à verificação ser definida pela própria entidade interessada põe em dúvida a validade e a confiabilidade desse procedimento, situação que somente foi contornada a partir das fiscalizações instauradas em dezembro de 2024, cinco meses após a CGU ter recomendado a utilização, em avaliações de conformidade documental, de amostra com seleção efetuada pelo próprio INSS”, afirma o órgão de controle.
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Defesa
Durante a auditoria, o INSS foi consultado pela CGU, afirmando que já possuía diversas medidas de melhoria quanto aos ACTs sendo implementadas com o objetivo de sanar irregularidades, além de ressarcir os beneficiários que foram afetados pelos descontos indevidos.
Segundo consta no relatório da Controladoria, em resposta, o INSS já havia afirmado que deu início a um processo institucional de revisão e robustecimento dos fluxos e controles dos descontos associativos no sentido do aperfeiçoamento da gestão.
O INSS também destacou que orientou os segurados quanto à verificação de possíveis descontos de mensalidade associativa por meio do extrato de benefícios. Caso fosse identificado algum desconto não autorizado, informou que seria possível solicitar o imediato bloqueio dos descontos.
“Assim, verifica-se que, no âmbito do INSS, em meio ao recebimento de recomendações e/ou determinações de controle da CGU e do Tribunal de Contas da União (TCU), a Autarquia já vinha adotando medidas iniciais voltadas ao aprimoramento da situação”.
Um dos exemplos que vêm sendo trabalhados, segundo o INSS, é a implementação de uma ferramenta, juntamente com a Dataprev, que exija a confirmação, via MEU INSS, do termo de adesão aos descontos.
O INSS afirmou ainda que não há previsão de celebração de novos ACTs ou mesmo restabelecimento dos acordos suspensos, e nem de quais serão os termos que serão abordados para formalizar os acordos.
O órgão também ressalta que só deve voltar a celebrar novos acordos após a conclusão das apurações em curso, “especialmente no que respeita ao ressarcimento aos beneficiários lesados. Não haverá restabelecimento a entidades que causam prejuízos aos beneficiários e ao INSS”.
O INSS também cita a implementação de uma série de procedimentos de apuração de irregularidades nos ACTs, além de providências adotadas em caráter disciplinar, além da instauração de 12 Processos Administrativos de Responsabilização (PARs), posteriormente avocados pela CGU.
“Está em curso, na Corregedoria do INSS, Processo Administrativo Disciplinar instaurado em face dos servidores desta Autarquia, destacando que os servidores envolvidos foram preventivamente afastados”, afirmou.
Por fim, concluiu ressaltando o fato de que as devoluções aos aposentados e pensionistas que tiveram seus benefícios descontados irregularmente já começaram, cujo primeiro pagamento foi em julho deste ano.
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