Os fantasmas da falência do Grupo Pupin, do Rei do Algodão
Recuperação judicial do conglomerado de fazendas foi citada na Operação Sisamnes, que investiga a venda de decisões judiciais
A recuperação judicial do Grupo Pupin, do Rei do Algodão, chegou ao fim rodeada por fantasmas. Para além das denúncias de desvios e fraudes, o grupo está envolvido na maior operação da Polícia Federal (PF) sobre venda de sentenças judiciais, que alcança magistrados do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MJ) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
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A Operação Sisamnes começou com o assassinato do advogado Roberto Zampieri, em Cuiabá (MT), no dia 5 de dezembro de 2023. No celular de Zampieri, os investigadores encontraram conversas e documentos que indicariam negociações para a compra de decisões judiciais. Em um dos diálogos interceptados, o advogado afirmou ao empresário Haroldo Filho, do Grupo Fource, que teria acertado com um desembargador um resultado que beneficiava o Grupo Pupin.
O Rei do Algodão, o empresário José Pupin, por sua vez, ingressou com uma ação na Justiça estadual acusando o Grupo Fource de ‘se infiltrar” no processo de recuperação judicial e, assim, assumir o controle patrimonial da empresa, desviando recursos milionários sob o pretexto de promover a reestruturação financeira.
Diante da suspeita de envolvimento de pessoas com foro privilegiado, a Operação Sisamnes passou a ser supervisionada pelo ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O caso, no entanto, está longe de ser o único fantasma que assombra todo o processo de ruína do grupo que foi, por décadas, exemplo da força do agronegócio brasileiro. José Pupin não foi apelidado de Rei do Algodão à toa. O empresário chegou a plantar, na mesma safra, 110 mil hectares de algodão em Mato Grosso — a área é equivalente a da cidade do Rio de Janeiro.
O império, no entanto, caiu junto com o preço do algodão no mercado internacional. Em 2014 veio o primeiro sinal de que os negócios não iam tão bem. Pupin perdeu uma fazenda de 45 mil hectares em Paranatinga, no interior de Mato Grosso. O imóvel era a garantia de um empréstimo de US$ 100 milhões, que não foi quitado.
O pedido de socorro à Justiça, por meio da recuperação judicial, veio em 2017. A lista de credores do Grupo Pupin é enorme. Tem bancos, como Votorantim, Santander, Banco do Brasil, ABC Brasil, Rabobank e Eximbank, dos EUA, além de empresas de maquinário, sementes, fertilizantes e outros insumos agrícolas como John Deere, Cargill, Bayer, Arysta, Adama e Syngenta.
A lista de bens do grupo também é enorme: só de imóveis, há 151 matrículas. Ao longo da recuperação judicial, 19 foram vendidos, todos por ordens judiciais, incluindo três “mega fazendas”, todas no interior de Mato Grosso — uma delas foi vendida por quase R$ 100 milhões.
Em 2019, o grupo deixou de realizar atividades operacionais — como plantar algodão. Desde então, entra no caixa apenas dinheiro do arrendamento de parte das fazendas enquanto as dívidas se avolumavam. A soma de todos os bens, o ativo, do grupo é estimado, hoje, em R$ 2,89 bilhões. Já as dívidas podem superar os R$ 5 bilhões.
Credores afirmam, no entanto, que não foram apenas as decisões judiciais que sangraram o patrimônio do grupo. Relatório do comitê de credores aponta o uso do patrimônio da recuperação judicial para pagar dívidas pessoais de familiares de José Pupin e Marisa Camargo Pupin. Foram identificadas movimentações suspeitas de R$ 430 milhões em contas vinculadas à empresa José Pupin & Cia e transferências de mais de R$ 95 milhões para Gustavo Camargo Pupin e seu núcleo familiar, sem lastro documental.
A falência foi a opção de todos os credores que participaram de assembleia no início do mês de dezembro. Agora o processo segue para análise da 1ª Vara Cível de Campo Verde, responsável pela condução da recuperação judicial do grupo.
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