Os horizontes de 2026 (por Gaudêncio Torquato)
Lula está no páreo, mas padece do fenômeno do “desgaste de material”

Os horizontes de 2026 começam a tomar forma no País. Lula e Tarcísio surgem como os dois contendores mais viáveis para vencer o pleito eleitoral de outubro. Qual dos dois teria melhores condições de subir a rampa do Planalto? Lula, se a economia estiver bombando; Tarcísio, se mantiver o discurso moderado e mostrar resultados de peso na alavancagem da infraestrutura do Estado de São Paulo. Bolsonaro é carta fora do baralho.
Vamos à análise, começando pelo fato de que Bolsonaro, apesar do forte capital político, dificilmente escapará à prisão no final do julgamento do Supremo Tribunal Federal.
Lula está no páreo, mas padece do fenômeno do “desgaste de material”. Chegará em 2026 com 80 anos, três mandatos no currículo e forte rejeição acumulada. Mesmo assim, como candidato, deverá ir para o segundo turno. E mais: se driblar os efeitos danosos do tarifaço imposto por Donald Trump, terá boas chances de abrir o ciclo de quatro mandatos presidenciais no País.
Tarcísio, por sua vez, tem procurado se legitimar como nome de consenso do campo liberal, mas fez um desvio de rota no discurso de 7 de setembro, adotando o tom agressivo e ideológico típico de Bolsonaro. Até então, o equilíbrio o aproximava de setores médios da sociedade; agora, o governador de São Paulo concentra-se no apoio dos simpatizantes bolsonaristas, que somam 25% do eleitorado, além de outros núcleos da direita e parte do centro, aqui com 20% do eleitorado. Restam outros 40% de eleitores, que não se identificam com nenhum posicionamento, segundo pesquisa recente da CNN Brasil, enquanto de 15% a 21% alinham-se à esquerda.
O melhor dos mundos a Tarcísio seria manter a bênção de Bolsonaro e evitar o radicalismo, o que o tornaria um “bolsonarista viável” para parte do eleitorado de centro-direita, crescendo como um nome confiável e sem o desgaste da poeira do tempo. O governador se encaixa nesse figurino. Governa o Estado mais rico e estratégico do País. Caso entregue bons resultados (infraestrutura, segurança, educação), se consolidará como gestor eficiente, tornando-se a alternativa mais viável para a direita, já que pode atrair setores moderados e decepcionados com Lula. É preciso, no entanto, combinar com os demais pré-candidatos da direita: Ratinho Júnior, Romeu Zema e Ronaldo Caiado; se confirmarem a intenção de entrar na disputa, haverá pulverização nos votos da direita, diminuindo as chances de todos.
Pesquisas indicam que uma única candidatura da direita teria melhores condições de vencer Lula. A experiência brasileira demonstra que a concentração de forças é mais eficaz quando se trata de enfrentar um governo com base sólida. Em um cenário hipotético no qual a oposição se apresenta com apenas um candidato, este poderia alcançar até 48% dos votos no primeiro turno, contra 42% do governista. Essa vantagem não apenas garantiria vaga no segundo turno como permitiria construir uma narrativa clara: o País teria diante de si duas alternativas bem definidas. A pulverização, de outro modo, enfraqueceria as chances da oposição no turno final.
Há de se admitir que Lula ainda tem apoio consolidado em setores populares, mesmo sem repetir o vigor de 2006 ou mesmo de 2022. Ademais, o PT terá dificuldade em lançar outro nome competitivo. Haddad e Jaques Wagner, os mais citados como possíveis candidatos, não têm o apelo carismático do presidente, o que tende a reforçar a polarização entre Lula e um sucessor à direita. Lula dispõe, ainda, de novo trunfo nas mangas: a narrativa que começa a expressar, ao avocar a defesa da soberania do Brasil, que teria sido aviltada pelo todo-poderoso “imperador do mundo”, o magnata norte-americano, Donald Trump, com sua política de terra arrasada, que devassa economias de países aliados e não alinhados aos EUA.
Como disse acima, se o Brasil passar ao largo da crise que assola as economias de 150 países punidos pelas tarifas de Trump, e conseguir alcançar índices positivos, diminuindo a estimativa de perda de até R$ 175 bilhões com o tarifaço de 50% sobre as exportações aos EUA, Lula aumentará suas chances.
E como ficaria Tarcísio? Temos de admitir que o eleitorado anda saturado de radicalismo, principalmente o eleitor de centro (classe média, empresários, profissionais liberais), e dá sinais de afastamento de candidatos engajados na política baseada em confronto. Daí a busca por um perfil conservador, pragmático e capaz de dialogar. Nesse aspecto, Tarcísio tem a vantagem de ser conservador nos costumes e bom gestor, desde que volte ao discurso moderado, sob pena de perder a parte do eleitorado do centro que não suporta mais conviver com o extremismo.
Até o dia 7 de setembro, Tarcísio sinalizava a pacificação tão desejada, ao se apresentar como referência de moderação. Mas no palanque da avenida Paulista, chamou o ministro Alexandre de Moraes de “tirano”, entrando de sola numa contenda que já causou muitos prejuízos ao País. Se retomar o equilíbrio, construirá base sólida como favorito em 2026, beneficiado pelo desgaste de Lula e a saturação do radicalismo de Bolsonaro. Para isso, reitero, precisará voltar ao discurso do comedimento e da prudência, manter bons resultados administrativos em São Paulo e não se contaminar pelos excessos do alinhamento ideológico.
Por último, é oportuno lembrar que a equação eleitoral não depende apenas da tática da oposição. Fatores como o desempenho da economia, a popularidade do presidente e a agenda política nos próximos meses terão impacto direto sobre o humor do eleitorado. Independentemente do contexto, a lição que emerge das simulações é clara: a fragmentação enfraquece, a unificação fortalece.
Gaudêncio Torquato é escritor, jornalista, professor emérito da ECA-USP e consultor político
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