Transporte precário impulsiona “rede social” da pirataria no Entorno
De acordo com a Anatrip, pelo menos 4 mil moradores de uma cidade do Entorno utilizam grupos para conseguir carona ou transporte pago
A precariedade do transporte público do Entorno do Distrito Federal tem feito com que a população busque outras formas de ir e vir da capital do país. Segundo um levantamento da Associação Nacional das Empresas de Transporte Rodoviário de Passageiros (Anatrip), o número de passageiros transportados pela linha Planaltina (GO)-Brasília caiu de 22.000, em 2018, para 12.570, neste ano — uma redução de quase 50%.
De acordo com a Anatrip, pelo menos 4 mil moradores de Planaltina de Goiás passaram a utilizar vans e carros particulares, organizados por grupos de redes sociais. Para conferir a história, o Metrópoles entrou em um grupo que organiza caronas entre o DF e o Entorno. Na comunidade, pessoas enviam mensagens oferecendo ou procurando alguém que faça o mesmo percurso que o seu.
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Transporte precário
A reportagem conversou com alguns integrantes do grupo, que pediram para serem identificados por nomes fictícios. Moradora de Cidade Ocidental (GO), Ana, 33 anos, disse que passou a utilizar os grupos de caronas há quatro meses.
“Um dos principais motivos é a superlotação. Depois de um dia exausto, é impossível você ficar em pé por duas horas dentro de um ônibus superlotado”, desabafou. Ela afirma que, por diversas vezes, chegou a passar mal. “Foi tão grave, que cheguei ao ponto de desmaiar, pelo desconforto e calor dentro dos ônibus”, comentou.
Ana disse que, para que ela pense em voltar a utilizar o transporte público, as coisas precisam mudar. “Tem que aumentar a frota. Isso ajudaria bastante. Além disso, o preço alto também afasta”, avaliou.
Quem também procurou o grupo foi Carla, 28, moradora de Luziânia (GO). Ao Metrópoles ela contou que passou a utilizar as caronas há três anos, quando começou a trabalhar no Plano Piloto.
“De carro, você chega mais cedo em casa, com mais conforto. A passagem é tão cara quanto o ônibus, mas você vai mais confortável e chega mais rápido”, observou. Ela também reclamou dos ônibus que fazem a linha entre Luziânia e o DF. “Alguns são mal estruturados. Os bancos são muito apertados e têm pouco espaço para as pernas”, detalhou.
Em Valparaíso de Goiás, a situação não é diferente, segundo Milena, 28. Ela disse que as condições dos veículos são precárias. “Já deixaram um cadeirante sem entrar no ônibus pois a plataforma não funcionou”, relatou.
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Além disso, ela reclamou da falta de linhas. “No meu caso, o ônibus só passa em horários específicos na ida para o trabalho. Na volta, já não passa nenhum. Sempre tenho que pegar para outra cidade próxima, descer na BR-040 e pegar um transporte por aplicativo ou terminar o percurso a pé”, pontuou Milena.
Por isso, há cerca de um mês, ela decidiu procurar os grupos de caronas. “Até tentei utilizar o transporte público, durante a minha primeira semana morando em Valparaíso. Só que vi a situação precária (dos ônibus) e desisti”, disse.
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Transporte pirataKEBEC NOGUEIRA/METRÓPOLES @kebecfotografo
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“Situação complexa”
O Metrópoles conversou com o secretário-executivo da Anatrip, Gabriel Oliveira, para entender a situação do transporte público do Entorno. “É custoso para os empresários, devido às longas distâncias percorridas pelos veículos”, explicou. Ele afirmou que, no transporte do Entorno, a ausência de subsídios governamentais para a tarifa é um ponto crucial. “O passageiro arca com o valor integral da passagem, ao contrário do DF”, esclareceu.
Gabriel afirmou que o aumento dos custos, como os de combustível, manutenção e salários, pressiona as empresas. “A ausência de um sistema de subsídios, como o existente no DF, agrava a situação, pois o modelo atual transfere o impacto das oscilações de custos para os passageiros”, ressaltou.
A consequência, segundo o secretário-executivo da Anatrip, é que os transportes clandestinos estão atraindo passageiros. “A queda na quantidade diária de passageiros transportados dificulta investimentos em melhorias e modernização da frota”, afirmou.
Para Gabriel, a criação do consórcio interfederativo pode trazer soluções para essa problemática. “A prioridade é reverter a evasão de passageiros, tanto para o transporte clandestino quanto para o uso de veículos particulares”, comentou. “A principal preocupação é a segurança dos passageiros, considerando os riscos associados ao transporte clandestino”, acrescentou.
Ele pontuou que, com o início do consórcio, os aumentos anuais de tarifas, autorizados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), cessem. “A longo prazo, a intenção é implementar uma redução gradual das tarifas, entre 10% e 15%, em um período de cinco anos. Essa decisão dependerá de estudos conjuntos dos governos do DF e de Goiás”, observou.
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