Xô, imigrante! (Por Tatiana Nascimento)

É a velha sombra da desigualdade que insiste em dividir o mundo. Fica quem é “bom” e vai embora quem não tem serventia

Jul 21, 2025 - 10:20
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Xô, imigrante! (Por Tatiana Nascimento)

O pacote de medidas aprovadas pela Assembleia da República, que restringe a entrada e a permanência de imigrantes em Portugal, parece mais um conjunto de punições a quem cometeu infrações no país, mas, nesse caso, muitos dos problemas foram causados pelo próprio Governo, que não se preparou para a “enxurrada” de estrangeiros que chegaram com a esperança de estabelecer em território luso uma nova residência, principalmente, brasileiros.

Além da insegurança e da frustração de ver as regras mudarem, fica a sensação de que somos malvistos, indesejados, e recebemos uma espécie de “castigo” por aqui estarmos.

É óbvio que Portugal precisa organizar sua casa e controlar a entrada de imigrantes para que os serviços de legalização funcionem, porém, isso não deveria ignorar todo um movimento que iniciou anos atrás e que, em grande parte, foi estimulado pelo próprio governo.

Obter a nacionalidade ficará mais difícil, o que causa certo desânimo naqueles que, como eu, já têm mais de quatro anos de residência legalizada no país, e agora, aos 40 minutos do segundo tempo, terão de esperar sete anos para pedir a cidadania portuguesa.

A pergunta que faço é: será que Portugal ganhou ou perdeu com nossa permanência aqui? Para responder essa questão, basta verificar os avanços que o país teve nas últimas décadas. A economia portuguesa certamente foi beneficiada com essa injeção de novos trabalhadores e consumidores no país.

E agora? De inquilinos desejados, passamos a “invasores”? Acho que muitos dos imigrantes devem estar com essa sensação no momento. Que pena! E que forma injusta de tentar resolver o problema. Por que não pensaram nas consequências antes de “escancarar” as portas? E por que não mudam as regras daqui para frente, sem desrespeitar os que já estão no país e tentam se legalizar? Penso nas pessoas que chegaram há um ou dois anos, que ainda não têm o título de residência, e agora correm o risco de ter que regressar e até ser expulsas do país.

A segregação explícita no pacote anti-imigração também me preocupa. Que venham apenas os “altamente” qualificados”… E quem serão esses? Quais os critérios dessa avaliação?

Há também dúvidas sobre a condução nos processos de quem ainda não tem a residência, mas conseguiu agendamento para ser atendido e pedir a autorização. Questões que geram ansiedade e insegurança, e que parecem transformar o imigrante em inimigo.

Esse pacote parece uma reação do governo diante de uma ação indesejada, sem levar em conta a sua responsabilidade no cenário criado no país. Claro que é preciso ordem, planejamento, e respeito às regras de onde vivemos. Claro que a falta de controle gera confusão, contudo, os imigrantes não são os responsáveis. Não devem ser punidos pelas falhas na estrutura e organização dos serviços que deveriam tratar desses processos.

É justo que permaneçam no país as pessoas que estejam legalizadas. O problema é que muitas estão em situação irregular porque os órgãos responsáveis não tiveram capacidade para atender a todos os pedidos.

É a velha sombra da desigualdade que insiste em dividir o mundo. Fica quem é “bom” e vai embora quem não tem serventia. Na hora de enfrentar seus desafios, Portugal opta pela exclusão, até novamente precisar de um fôlego que venha de fora.

 

(Transcrito do PÚBLICO-Brasil)

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