Paracetamol causa autismo em bebês? Saiba o que dizem as pesquisas

Trump aconselhou grávidas a não tomarem o medicamento. A Organização Mundial da Saúde (OMS) refutou a informação na terça-feira (23/9)

Sep 24, 2025 - 05:00
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Paracetamol causa autismo em bebês? Saiba o que dizem as pesquisas

O presidente norte-americano, Donald Trump, aconselhou grávidas a não tomarem paracetamol devido a um suposto risco de autismo que o medicamento causaria em bebês. A Organização Mundial da Saúde (OMS) refutou a informação na terça-feira (23/9), baseando-se em pesquisas sobre o assunto.

“Alguns estudos observacionais sugeriram uma possível associação entre a exposição pré-natal ao paracetamol e o autismo, mas as evidências permanecem inconsistentes”, disse o porta-voz da OMS, Tarik Jasarevic, em coletiva de imprensa ao ser questionado sobre as declarações do magnata republicano. “Vários estudos não estabeleceram tal relação”, reiterou, pedindo “cautela antes de concluir que existe uma relação causal” entre o medicamento e autismo.

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O acetaminofeno, também conhecido como paracetamol, é o medicamento mais recomendado a gestantes para aliviar dores ou febre. Outros remédios, como a aspirina ou o ibuprofeno, são contraindicados, especialmente no final da gravidez.

“Não tomem”, “não deem ao seu bebê”, declarou Trump na segunda-feira (22/9) durante uma coletiva de imprensa na Casa Branca dedicada ao autismo, um tema que intriga o presidente americano. “Segundo um rumor – e não sei se é verdade – não existe paracetamol em Cuba porque eles não podem se dar ao luxo de tê-lo. Pois bem, quase não há autismo lá”, afirmou.

O líder republicano ainda citou o grupo religioso cristão e ultraconservador amish para reforçar sua teoria. “Eles praticamente não tem autismo”, disse, Trump, referindo-se a essa comunidade que rejeita a tecnologia e a medicina moderna.

As declarações foram feitas ao lado do secretário da Saúde dos Estados Unidos, Robert Kennedy Jr, famoso por seu posicionamento antivacinas. No passado, o político ultraconservador defendeu diversas vezes supostos riscos de imunizantes anticovid, apontando – sem fornecer provas – relações entre vacinas e autismo.

Transtorno complexo e de amplo espectro, o autismo vem sendo estudado há décadas por especialistas em todo o mundo, mas o governo Trump prometeu, no início deste ano, descobrir em tempo recorde as causas do que classifica de “epidemia”. Na segunda-feira, o Departamento de Saúde dos Estados Unidos aprovou o uso de leucovorina no tratamento de certos aspectos do autismo, como o atraso de linguagem. Embora os casos tenham aumentado nas últimas décadas no país, boa parte da comunidade médica americana rejeita a existência de uma epidemia, ressaltando que melhorias nos diagnósticos resultam no registro dos aumentos de casos.

Manifesto médico de 2021

As declarações de Trump, no entanto, não surgem do nada. Um debate já existia na comunidade médica entre os anos 2010 para 2020. Os alertas, na época, geraram grande atenção da mídia — especialmente após um manifesto publicado em 2021 por cerca de cem pesquisadores e médicos na revista científica Nature Reviews Endocrinology.

“Recomendamos informar as mulheres grávidas, desde o início da gestação, que o paracetamol deve ser evitado, salvo indicação médica”, afirmava o texto criticado pelo tom considerado alarmista. Os autores justificavam a necessidade de vigilância com base em dados “experimentais e epidemiológicos” que “sugerem que a exposição ao paracetamol durante a gravidez pode afetar o desenvolvimento do feto”.

Alguns anos antes, um estudo publicado em 2015 na revista científica Autism Research, baseado em dados de saúde da Dinamarca, gerou uma forte polêmica. Após acompanhar crianças até os 12 anos de idade, a pesquisa concluiu que o risco de autismo aumentava em 50% quando suas mães haviam consumido paracetamol durante a gravidez. Em 2025, um outro estudo publicado na revista Environmental Health compilou os resultados de cerca de quarenta pesquisas e também defendeu essa possibilidade.

Mas muitos pesquisadores acreditam que esses estudos apenas sugerem pistas, diante da metodologia imperfeita. Um exemplo é a falta de indícios dos verdadeiros mecanismos de causa e efeito. Cientistas questionam, por exemplo, se não seriam os problemas que levam as grávidas a recorrerem ao paracetamol que facilitam o surgimento do autismo. “Sabemos que a febre (…) pode aumentar o risco de atrasos e transtornos do desenvolvimento neurológico”, aponta David Mandell, professor de Psiquiatria da Universidade da Pensilvânia.

Um dos maiores estudos sobre a questão foi realizado por um grupo de especialistas suecos e publicado no Jornal da Associação Médica Americana em 2024. A pesquisa acompanhou 2,48 milhões de crianças na Suécia, incluindo uma amostra reduzida dentro de grupos de irmãos, para considerar fatores genéticos e sociais. A conclusão apontou a falta de relação de causa e efeito entre o uso desse medicamento e o autismo.

Os autores explicam que mulheres analisadas na pesquisa e que consumiram paracetamol durante a gravidez são ligeiramente mais propensas do que outras a ter filhos com esses transtornos. No entanto, dentro de uma mesma família, a prevalência do autismo entre irmãos não muda quando o paracetamol foi consumido em uma das gestações.

Por isso, os cientistas vêm apostando mais no papel da genética. Outros fatores também vem sendo privilegiados, como a neuroinflamação ou o uso de antiepilépticos por grávidas.

Nenhum risco para a gestante?

Como qualquer medicamento, o uso de paracetamol durante a gravidez não é isento de riscos. No entanto, o principal perigo está relacionado à superdosagem, especialmente aos efeitos nocivos que o excesso que essa substância pode causar ao fígado.

“O paracetamol pode ser tomado durante a gestação”, mas “deve ser usado na menor dose eficaz, pelo menor tempo possível e com a menor frequência possível”, lembrou a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) nesta terça-feira (23).

“Nossa opinião é baseada em uma avaliação rigorosa dos dados científicos disponíveis e não encontramos evidências de que tomar paracetamol durante a gravidez possa causar autismo em crianças”, disse Steffen Thirstrup, diretor médico da agência europeia.

“Quase 62 milhões de pessoas vivem com um transtorno do espectro autista em todo o mundo, e está claro que, como comunidade internacional, devemos redobrar nossos esforços para compreender suas causas”, reforçou o porta-voz da OMS, Tarik Jasarevic.

Leia mais em RFI, parceira do Metrópoles.

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